O início da mudança do cinema português
Depois do 25 de Abril de 1974, o cinema português passou a ter mais liberdade para se exprimir e para praticar novas técnicas, que viriam a proporcionar uma maior produção nacional de cinema e uma maior difusão de filmes nacionais no estrangeiro. Nos anos 90 vão surgindo novas gerações de cineastas que criam obras inovadoras para o cinema português. Deve-se em grande parte pelos novos critérios de apoio financeiro a primeiras obras, do ICA. O cinema português renova-se nesta década, com: Pedro Costa, Teresa Villaverde, João Canijo, Manuel Mozos, entre outros, quase todos eles vindos da mesma escola de cinema, a Escola Superior de Teatro e Cinema, em Lisboa.
Mas é no século XXI que o cinema português começa a crescer em força e que pode e deve ser visto no estrangeiro, em importantes festivais internacionais. A qualidade dos filmes portugueses tem vindo a melhorar consideravelmente, apesar de ser um processo bastante lento. Estes primeiros dez anos do séc.XXI são o arranque para uma mudança no cinema português, que lentamente tem vindo a melhorar, quer em termos técnicos, quer em termos artísticos. E o século começa bastante bem com a estreia de três filmes, no ao de 2000, que tiveram algum sucesso lá fora e que marcaram o cinema nacional. “Capitães de Abril” de Maria de Medeiros, que é até ao momento o primeiro filme a tentar reconstruir os acontecimentos da Revolução dos Cravos. Este filme teve uma co- produção com França, Itália e Espanha e foi um êxito internacional. “Ganhar a Vida”, de João Canijo, um filme que retrata a emigração portuguesa, e que esteve presente em Cannes (2001), na selecção oficial – Un Certain Regard. O terceiro filme é “O Fantasma” de João Pedro Rodrigues, que é a primeira longa metragem do realizador e obteve de imediato um enorme êxito internacional, na Europa, EUA e Brasil. O filme aborda a obsessão e o fetiche na homossexualidade masculina. “O Fantasma foi provavelmente a primeira obra de um realizador português que maior sucesso comercial alcançou no estrangeiro.”.(1)
Depois seguiram-se filmes mais comerciais como “O Crime do Padre Amaro”, de Carlos Coelho da Silva (2005), que ainda hoje é o filme português mais visto de sempre, com mais de 380mil espectadores e em segundo lugar,“Filme da Treta”, de José Sacramento (2006), com mais de 278mil espectadores. Ainda em 2005 surge “Alice”, deMarco Martins (2005), sua primeira obra de ficção, que aborda o tema de uma filha perdida na cidade de Lisboa. O filme ganhou o prémio Regards Jeunes – Melhor Filme da Quinzena dos Realizadores – 2005, no Festival de Cannes. Em 2006, os filmes “Transe”, de Teresa Villaverde e “Juventude em Marcha”, de Pedro Costa, estiveram presentes em Cannes. Em 2008, estreia “Aquele Querido Mês de Agosto”, de Miguel Gomes “é uma das mais importantes actualizações do imaginário do mundo rural no cinema português do pós-25 de Abril.”(2). Um filme ficção/documentário que ganhou vários prémios em festivais internacionais, como, São Paulo e Buenos Aires. Ainda no mesmo ano estreia a primeira biografia ficionada da fadista Amália Rodrigues, “Amália – O Filme”, de Carlos Coelho da Silva. Este é o quinto filme português mais visto, com mais de 214mil espectadores.
Como se pode reparar à medida que os anos passam o cinema português melhora bastante, até que os dois últimos anos da primeira década do século XXI (2009 e 2010) foram o auge da década. Ao analisar os dados do ICA, da lista sobre os filmes nacionais mais vistos entre 2004/2011 (3), reparamos que numa lista de quarenta filmes, onze são produções de 2009 e 2010.
Em 2009, João Pedro Rodrigues realiza mais um filme que atinge algum sucesso internacional. “Morrer como um Homem”, é um drama que acompanha o dia-a-dia de Tonia, um travesti veterano que vê as suas convicções pessoais serem questionadas num relacionamento amoroso. Marcou presença em Cannes, na secção Un Certain Regard e foi o filme português candidato ao Óscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira, para a 83ª edição.
O cinema comercial português continua a chamar algumas pessoas aos cinemas, apesar da fraca qualidade, como os filmes “Uma Aventura na Casa Assombrada” (2009) de Carlos Coelho, “A Bela e o Paparazzo” (2010) deAntónio-Pedro Vasconcelos, “Second Life” (2009) de Alexandre Valente, “Contraluz” (2010) de Fernando Fragata, “Contrato” (2009) de Nicolau Breyner e “Star Crossed – Amor em Jogo” (2010) de Mark Heller. Todos estes filmes estão na lista dos filmes portugueses mais vistos.
Chegamos ao ano de 2010, o último ano da primeira década do séc.XXI e o auge do cinema português. Este foi sem dúvida o melhor ano para o cinema português quer em qualidade, quer em número de espectadores. Apesar de o número de produções portuguesas que estrearam em 2010 serem normais (26 longas-metragens e 6 curtas- metragens), está dentro da média, neste ano estrearam três obras de arte do cinema português, são elas, “Filme do Desassossego” de João Botelho, “Mistérios de Lisboa” de Raoul Ruiz e “José e Pilar” de Miguel Gonçalves Mendes. Todos eles obtiveram bons resultados de bilheteira, tendo em conta o género e duração de filme, e receberam prémios internacionais. “Fantasia Lusitana” de João Canijo, “Embargo” de António Ferreira e “Pare, Escute, Olhe” de Jorge Pelicano são alguns exemplos de filmes que estrearam em 2010 e que mostram ter qualidade e vontade de fazer um cinema diferente.
O ano termina em grande com o regresso de dois grandes filmes de Manoel de Oliveira nos cinemas, “Aniki Bóbó”(1942) e “Douro, Faina Fluvial” (1929). Manoel de Oliveira também continuou a realizar filmes, com uma média de um filme por ano. É de destacar os filmes, “Vou para Casa” (2001), “Um Filme Falado” (2003), “Belle Toujours”(2006) e “Singularidades de uma Rapariga Loura” (2009).
1) Tirado do livro “A Invenção do Cinema Português” de Tiago Baptista, página 198 e 199, edições Tinta da China, Novembro 2008, Lisboa.
2) Tirado do livro “A Invenção do Cinema Português” de Tiago Baptista, página 218 e 219, edições Tinta da China, Novembro 2008, Lisboa.
3) Documento do ICA (Instituto do Cinema e Audiovisual) – “Filmes Nacionais Mais Vistos – 2004/2011” (dados até 26 de Janeiro de 2011).
Artigo escrito por Eduardo Magueta e Tiago Resende