Crescemos, florescemos, evoluímos e expandimos a nossa mente e corpo em direção ao desconhecido. Conduzimos em direção ao envelhecimento, tão querido e ao mesmo tempo temido. Declarando a nossa calma quando dizemos “temos tempo” e vamos, quase que sem querer, apressando esta necessidade de crescer em direção ao que a sociedade nos obriga. Estudar e crescer, trabalhar e crescer, parir e crescer. Onde está o nosso musical?
Querer romantizar os dias, querer ter tempo para o momento, para o hoje e para o agora. Querer mudar de forma súbita e estúpida futilidades, acredito ser uma essência nossa, da pessoa. Hoje ouvimos, vestimos e falamos da mesma forma em como amanhã, nos vamos aborrecer do que foi ontem. Quero um musical. Quero começar uma banda.
Gostava de puder dizer que conheci “Sing Street” (2016) com os meus 16 anos, na verdade, encontrei-me com a narrativa de Conor (Ferdia Walsh-Peelo) um pouco mais tarde, numa fase da vida diferente da que nos oferecida pela história de John Carney. Admito, não sou fã de musicais, considero-os parvos na forma como fogem à realidade, no entanto Sing Street não poderia afastar-se mais desta premissa. Na verdade, confio que seja neste filme que um pouco de nós guarda a sua realidade.
Conor, um adolescente de 15 anos, sobrevive na normalidade da cultura da capital irlandesa dos anos 80, fruto de uma família que vive na sua vulgaridade babélica de um casamento que se vai desfazendo no decorrer do filme, quando encontra Raphina (Lucy Boynton) e transforma a sua vida em torno deste encontro. Cria uma banda, e à medida que os pensamentos, sentimentos e emoções se transformam, o pilar do grupo muda, alterando tudo o que a envolve, estilo musical, caracterização e atitude. Poderá parecer de certo modo uma visão infantilizada da vida que conduz a narrativa de “Sing Street” (2016), porém, é precisamente esta concepção da vida que creio ser a que, no fundo, nos conduz a todos pela nossa urgência de crescer e viver.
Raphina é uma jovem numa fase diferente da sua vida, outras responsabilidades e interpretação do momento, cultivando, assim, o fatalismo da pseudo-paixão de Conor, que, aparentemente, existe na sua imaturidade e ignorância.
Em consequência deste fado, nasce o paradigma, o nosso fado, com o qual acredito que muitos, jovens e não jovens, encaramos e desafiamos numa perspetiva talvez, diária, o ceder à iminência de evoluirmos, sermos mais e mais na sociedade, enquanto construímos a nossa própria utopia romântica face à interpretação do nosso dia-a-dia.
“Sing Street” dá uso da importância que a sétima arte tem e em como a mesma pode ser transformada num abraço para as nossas inquietações. Um conforto nostálgico, onde a música comporta a sua devida importância e que alimenta também a idealização teatral de uma vida mais bonita e menos melancólica. Sing Street é o exemplo de como vivemos a nossa singularidade de forma semelhante. Em como sonhamos com um musical, com uma paixão platónica que nos obriga a crescer permanecendo crianças, que nos obriga a construir mesmo quando nos vemos presos a um conceito abstrato imposto por nós mesmos. Crescer.
Na verdade, não é só a sociedade que impõe a tensão destas responsabilidades que, nós próprios exteriorizamos com necessidade de crescer para chegar a algo ou alguém, correr para encontrar Raphina.
Este filme faz-nos refletir sobre o nosso crescimento, sobre a construção da nossa banda, sobre a forma como sofremos várias metamorfoses ao longo das nossas infinitas mudanças, e em como, na verdade, estamos sempre com pressa para lá chegar. Lá. Confessamos que não é só Sing Street que nos oferece várias metáforas para ingenuidade da vida e como queremos sempre ultrapassá-la. Mas é este filme que nos aquece na simplicidade de uma história que, enquanto humanos, gostávamos que também fosse nossa.
Ceder à urgência de crescer, alimentando o romance da nossa existência é, em parte, boa parte, um paradoxo que nos vai acompanhar no percurso da nossa vida. Crescer rápido e impacientemente faz parte de nós, e fez parte de Conor para chegar a Raphina, romantizá-la e de certa forma torna-la clichê, quero acreditar que também tem espaço na minha vida. “Sing Street” é isso, e o bom cinema também. Acompanhar o nosso crescimento e romantizá-lo. Confiar-nos conforto e questioná-lo, torná-lo realidade ou usá-lo para fugirmos da nossa.
Quando encontrei “Sing Street” tinha 23 anos, e felizmente, concebeu-me uma visão da sétima arte e da minha vida que considero muito positiva. A simplicidade daquilo que vivemos e exploramos uns com os outros, é o que nos faz crescer sem nunca ter de abandonar a fantasia de apanhar um barco e viajar para encontrar uma nova realidade.