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«Da Eternidade» – Quanto vale a nossa existência?

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Difícil mesmo é selecionar (recolher seria a palavra mais apropriada), um somente “sketch” em toda esta cadeia narrativa de Roy Andersson. Mas se tivesse que quebrar a regra seria numa particular discussão entre um padre que se debate com a sua repentina falta de fé (e os sonhos de natureza sacra como complemento) com um médico o qual recorre para encontrar o antídoto para os seus males. Após confessar o profissional de saúde que a sua patologia é do foro existencial, desesperado, questiona-o após receber a prescrição de uma inteira ausência de crença – “No que vamos acreditar se Deus não existir?

Sei lá eu, talvez na nossa existência?” responde-lhe. A partir deste momento desejamos voltar aos dramas intrínsecos deste vigário sem determinação nas suas pregações, o revisitar que será ocasional nesta corrente de situações que se deparam na beira da tragédia, obtendo resultados quer hilariantes mas igualmente destroçadores. Aliás, este “Na Eternidade”, o filme que continua a tradição dos viventes do segundo andar ou dos pombos filosóficos é todo ele embebido na definição de tragédia – a conjugação do trágico com a comédia – que nos encaminham para uma reflexão da nossa própria existência. Esta, nutrida, desvalorizada e demasiado sacrificada para um bem comum.

Porque aqui, a tristeza não tem lugar num banco de autocarro sob os olhos dos restantes seres pálidos e melancólicos, ou as experiências angariadas que soam como inúteis perante um doutoramento ou do dentista cativo dos seus pensamentos que evade (repentinamente) do seu consultório para se refugiar num bar lotado – “É tudo fantástico” – diz um dos consumidores naquele coletivo inanimado. Pronto, menti-vos, acabei por citar mais umas quantas historietas que compõem os pensamentos aqui envolvidos que se dão pelo nome de filme. Contudo, a vida é curta, em breve chegaremos a setembro e descobrimos que pouco ou nada desfrutamos destas ditas “férias da morte”.

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Da Eternidade” nada restará (nem mesmo as ideologias com que abraçamos, aqui de maneira pictórica numa recriação do quadro “O Fim de Hitler”, de Kukryniksy), a futilidade da nossa sociedade que depende do transporte diário que encaminha milhões para as suas respetivas habitações como o seu mais consagrado Deus, marcando oposição a toda aquela matéria que supostamente constitui a alma. A nossa existência é ridícula, e até mesmo mesquinha, e Roy Andersson bem o sabe.

Sete anos depois de “Um Pombo Pousou Num Ramo a Refletir na Existência” (laureado com o Leão de Ouro em Veneza), o sueco continua a aplicar essa raiz quadrada da nossa resiliência por este mundo, um niilismo embelezado narrado à bela maneira de Xerazade (ou fazendo-se passar por um versão modernizada e desencantada de Mil e uma Noites), que nos confronta com uma mortalidade sem importância.

O absurdismo desde gags violentíssimos é como uma resposta à relação desconcertante de Andersson para com esses fantasmas a quem chamamos de adultos, isto, em contraste com os jovens que celebram a sua juventude numa inconsequente “felicidade” (as aspas servem para disfarçar o nosso bovarismo crónico). Um belíssimo e igualmente doloroso retrato … de nós próprios e da nossa presença neste mesmo lugar, o Mundo.

«Da Eternidade» – Quanto vale a nossa existência?
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