Jorge Jácome: “A ideia base do ‘Super Natural’ é ser um filme performativo”

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O Cinema Sétima Arte teve a oportunidade de entrevistar o realizador Jorge Jácome sobre o seu novo filme Super Natural”, que está agora nos cinemas nacionais. O filme nasceu da colaboração entre as companhias Dançando com a Diferença e Teatro Praga.

Produzido pela Ukbar Filmes, em coprodução com Dançando com a Diferença e Teatro Praga, integram o elenco Alexis Fernandes, Bárbara Matos, Bernardo Graça, Celestine Ngantonga Ndzana, Diogo Freitas, Isabel Gomes Teixeira, Joana Caetano, Maria João Pereira, Mariana Tembe e Milton Branco.

Cinema Sétima Arte: Como nasceu a ideia de filmar “Super Natural”?

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Jorge Jácome: O “Super Natural” é um filme que resulta da minha colaboração com as companhias “Dançando com a Diferença” – uma companhia profissional sediada na Madeira que junta pessoas com e sem deficiência – e o “Teatro Praga”.

Esta colaboração implicou um tempo para um convívio e uma convivência que se fez não só do encontro entre pessoas mas também do reconhecimento do seu meio, tanto o meio familiar como o geográfico da ilha da Madeira.

A partir daí, o filme foi um processo de se ir descobrindo como trabalhar os diferentes elementos que o constituem, evidenciando conceitos como “inclusão” e “diferença”, preferindo novos procedimentos laborais e procurando visibilizar outras historiografias sobre o processo de humanização, cruzando física quântica com neurologia, biofísica, engenharia e poesia.

CSA: Este não é um filme convencional, isto é, o filme possui várias camadas que o tornam um objeto muito específico e complexo. Que palavras usaria para definir o filme?

JJ: Diria que o filme é uma viagem, em capítulos ou etapas, por lugares e intérpretes captados de muitas formas: câmaras de vigilância, câmaras de alta resolução, telemóveis, película, cassetes-de-vídeo.

Mas também posso dizer que é um filme sobre encontros: encontros entre companhias, entre um filme e o seu público, entre mim e uma ilha, entre imagem e som, entre o que se vê e o que se sente.

“A ideia base do Super Natural é ser um “filme performativo”, na medida em que simula uma relação com o que lhe é exterior, procurando e interferindo com o que está à sua frente para que ele próprio consiga sair de si.”

"Super Natural" (2022), de Jorge Jácome

CSA: O filme parece desfazer as fronteiras entre vários meios artísticos e condensar dentro de si uma pluralidade de formas de expressão. Ele vai jogando e sintetizando a experiência performativa para dentro da forma cinematográfica (a mistura entre os elementos visuais e sonoros), sem deixar de convocar conceitos mais intelectuais ou filosóficos, sem que estes apareçam apenas como subtexto, mas que são incorporados nessa mesma superfície, fazendo com que mesmo as dimensões mais abstractas se tornem bastante sensíveis para quem vê o filme. Podemos dizer que o filme em si, na sua forma ou materialidade, já é de certa forma um objecto Super Natural?

JJ: A ideia base do Super Natural é ser um “filme performativo”, na medida em que simula uma relação com o que lhe é exterior, procurando e interferindo com o que está à sua frente para que ele próprio consiga sair de si. Há uma voz que fala connosco – enquanto espectadores – mas que também fala com a sala de cinema, com as imagens que está a mostrar, com os intérpretes que estão a “representar” connosco mas também com o mundo visível e invisível.

É por isso que este filme interpela e ambiciona ativar um efeito, um relaxamento hipotético, uma experiência sensorial para quem está fora da tela como se nela estivesse.

O filme é ao mesmo tempo filosófico, concreto, sensorial e abstrato. O conceito de Super Natural é isso mesmo: é essa junção de vários elementos que procura colocar o espectador em confronto direto com a multiplicidade e a complexidade do “natural”.

Queríamos fazer um filme, a partir da sua forma ou materialidade, que pudesse replicar uma viagem que pudesse desfazer algumas fronteiras, mas que sobretudo contemplasse tanto os primórdios do aparecimento da humanidade como o futuro incerto do planeta.

“O filme parece estar sempre a transformar-se à frente dos nossos olhos e dos nossos ouvidos.”

CSA: Por onde começou a nascer o filme; ou, para onde o Jorge olhou primeiro? Para os espaços/paisagens, para o conceito base, para as personagens, para o texto?    

JJ: Como o próprio filme nos diz: “Tudo começa e acaba ao mesmo tempo”. Neste filme nunca existiu propriamente um início e um fim do processo. Há “espaços” que só foram encontrados durante a montagem e ideias de montagem que surgiram mesmo antes de começarmos a filmar.

É muito difícil definir a linearidade do processo criativo deste filme porque o processo foi sendo construído com todos os elementos ao mesmo tempo. Às vezes foi um pedaço de texto que deu lugar a uma imagem, outras vezes foi um espaço que inventava um novo som.

Mas acho que essa sensação se sente quando se está a ver o filme. O filme parece estar sempre a transformar-se à frente dos nossos olhos e dos nossos ouvidos.

CSA: O Jorge, no seu percurso como realizador, filmou cinco curtas-metragens; esta foi a sua primeira longa. Quais os principais desafios que encontrou na passagem de um formato para o outro?

JJ: Cada filme é sempre um desafio diferente. O espaço onde estou a filmar, os intérpretes que estou a conhecer, a luz e a meteorologia que vou encontrando é que definem o que o filme se vai tornar. É sempre um processo de descoberta. A única coisa que tenho a certeza é que não é a duração que determina o processo do filme. Por isso, não consigo definir diferenças entre o formato longo e curto.

CSA: Já tem em mente uma próxima longa-metragem?

JJ: Depois desta longa-metragem, que está agora nos cinemas, estou neste momento a terminar a montagem de uma nova curta-metragem mas também a preparar uma nova longa-metragem.

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