Rogério Sganzerla (1946-2004), uma das figuras de destaque no cenário cinematográfico brasileiro dos anos 60 e 70, reconhecido especialmente por realizar o icónico filme “O Bandido da Luz Vermelha” (1968), terá sua filmografia em destaque durante o decorrer deste mês de agosto. Essa celebração acontecerá tanto na 76ª edição do Festival de Locarno quanto em eventos em Portugal.
No dia 10 de agosto, o público que prestigia o festival suíço terá a oportunidade única de apreciar duas obras pouco comuns de Sganzerla. O raro longa-metragem “Abismu” (1977) e seu filme de estreia, o curta “Documentário” (1966), serão exibidos como parte da mostra “Histoire(s) du cinéma”. Essa exibição faz parte de uma seção paralela do festival dedicada aos mestres da história do cinema mundial, onde Sganzerla é o único representante latino-americano.
Dentro deste contexto, os filmes de Sganzerla compartilharão espaço com obras de renomados realizadores mundialmente reconhecidos, como os britânicos Alfred Hitchcock (1899-1980) e Ridley Scott, bem como o francês Jean-Luc Godard (1930-2022).
Antes da exibição especial, as obras foram celebradas em uma retrospectiva dedicada ao realizador, na “Mostra Cinema Fora da Lei – Ciclo de cinema Rogério Sganzerla & Helena Ignez”, que ocorreu no Cinema Trindade, no Porto, durante os dias 4 a 6 de agosto.
Nos dias 4, 5 e 6 de agosto, foram exibidos três clássicos de Sganzerla, “O Bandido da Luz Vermelha”, “A Mulher de Todos” (1969) e “Copacabana Mon Amour”, ao lado do documentário de Sinai Sganzerla sobre sua mãe Helena em “A Mulher da Luz Própria” (2019) e o mais recente longa realizado e estrelado por sua viúva Helena Ignez, “A Alegria é a Prova dos Nove” (2023).
“É uma grande alegria voltar a Locarno com dois filmes do meu pai, Rogério Sganzerla, na mostra Histórias do Cinema, onde ele já esteve anteriormente com ‘Copacabana Mon Amour’ (1970) e minha mãe esteve com o média-metragem ‘Poder dos Afetos’ (2013)”, declara Djin Sganzerla, filha do casal de realizadores que também herdou a paixão pelo cinema.
Segundo a atriz e realizadora, esse retorno também é um “reconhecimento cada vez mais forte desse realizador singular, que pertence a esse ciclo de realizadores que fizeram um cinema único, como esses próprios que estão nesta mostra“.
“Documentário” e “Abismu”
Em seu primeiro trabalho como realizador, Sganzerla concebeu uma homenagem à Sétima Arte através do curta “Documentário”. Que, apesar do título, se configura como uma obra fictícia na qual dois jovens vagam pelas ruas em busca de um filme para apreciar.
Por sua vez, o singular “Abismu” terá a chance de ser redescoberto pelos amantes do cinema, pois apenas um número limitado de espectadores brasileiros teve a oportunidade de testemunhar essa jornada sensorial e existencial. A trama transita entre a filosofia, o esoterismo, a música e uma variedade de temas, contando com a participação de Norma Bengell, José Mojica Marins, Wilson Grey e Jorge Loredo no elenco.
“A origem ancestral das Américas e a rica complexidade do nosso país é o caminho imprevisível seguido por este cataclismo musical, que é também uma homenagem à guitarra de Jimi Hendrix“, define Helena Ignez, viúva de Rogério e musa de vários trabalhos dele.
“Abismu foi filmado nos anos mais ardentes e soturnos da ditadura militar. Eu estava grávida de Djin durante este filme monumental, que é o único filme de ficção realizado por Rogério em que não participo. Norma Bengell, atriz maravilhosa e minha amiga, veio da Itália, onde estava morando, e desejava trabalhar com Rogério“, recorda a atriz e cineasta, que apresentará as sessões de ambos os filmes em Locarno, no dia 10 de agosto, ao lado da filha Djin Sganzerla.
As exibições de “Documentário” e “Abismu” em duas salas do PalaCinema contarão com cópias DCP 2K, telecinadas dos originais graças ao esforço da Mercúrio Produções e da filha e igualmente cineasta Sinai Sganzerla.
“Quase 20 anos após seu falecimento, os filmes do meu pai são descobertos no mundo. A preservação de seus filmes é fundamental também para preservação da cultura brasileira e o nome do meu pai dentro da mostra Histoire(s) du cinéma, dedicada aos mestres do cinema mundial (sendo o único da América Latina), representado por dois filmes que pouco são vistos no Brasil, diz que precisamos valorizar a nossa cultura e memória sempre”, destaca a Djin.