Passadas quatro longas-metragens de animação (com direito a nomeação para Óscar para cada uma), os estúdios Laika fazem estrear em 2019 “Mr. Link”, o mais recente filme de animação do estúdio, que conta com argumento e realização de Chris Butler. Depois de “Coraline e a Porta Secreta”, “ParaNorman”, “Os Monstros das Caixas” e de “Kubo e as Duas Cordas”, “Mr. Link” tem o encargo de defender um estado de graça adquirido pelo estúdio, especialmente depois de vários sucessos de bilheteira e de crítica.
No filme, Sir Lionel Frost (Hugh Jackman), um aventureiro londrino e descobridor de monstros mitológicos, procura recolher provas da existência de um ancestral humano parado na sua evolução, uma descoberta que (pensa este) lhe dará direito de conviver com os cavalheiros da alta sociedade. Acaba por encontrar a criatura (Zach Galifianakis) nos Estados Unidos, que baptiza de Mr. Link (encontrando-o com bastante facilidade até, dirá quem esperasse que a procura por Mr. Link fosse tomar o foco principal do enredo). Apercebendo-se da inesperada inteligência e solidão da criatura encontrada, Sir Lionel acaba por ser persuadido por esta a guiá-la até aos seus parentes distantes – os Yetis localizados no vale de Shangri-La, um território desconhecido situado nos Himalaias (usa-se aqui o termo Yeti em vez de um porventura mais familiar como Abominável Homem das Neves, não só pela muito menor extensão da expressão, mas, sobretudo, para fazer jus ao nome utilizado na versão original do filme).
Sir Lionel e Mr. Link (juntando-se depois a uma conhecida de Sir Lionel, de nome Adelina Fortnight e a quem a atriz Zoe Saldana empresta a voz) partem numa expedição por meio Mundo à procura dos Yetis, sendo constantemente perseguidos por William Stenk (Timothy Olyphant), um assassino contratado pelos londrinos da alta sociedade, indivíduos de mente fechada que não permitirão que a descoberta do monstro se torne pública e, consequentemente, o reconhecimento dos feitos aventureiros de Lionel Frost.
Pela primeira fez num filme da Laika, este não é protagonizado por uma criança. Poderá representar a vontade ou necessidade do estúdio crescer, de evoluir (ao contrário de Mr. Link), de se juntar a uma elite onde se encontram a Disney/Pixar ou o Studio Ghibli, porventura de expandir o espectro e de incluir também um público mais adulto como audiência alvo. Isto porque (pode-se debater o contrário, como é óbvio) é a capacidade de conseguir experienciar uma obra primeiramente como criança e depois como adulto (nunca por uma ordem inversa, infelizmente), conseguindo em cada etapa da vida retirar lições e aprendizagens distintas, é esta capacidade, dizia-se, um factor de peso para a memorabilidade e intemporalidade daquilo a que se chamam os filmes de animação, que não se deveriam considerar um mero género cinematográfico, mas sim um meio quase à parte do restante cinema denominado “live action”.
Aproveitando a referência à animação (utilizando a técnica de stop motion, tal como nos restantes filmes da Laika), este é um aspecto em que o filme investe realmente e que eximiamente consegue conjugar animação stop motion tradicional, um número anormalmente grande de cenários, movimentos fluidos e consistentes por parte de todas as personagens, juntando a estas características uma dose certa de efeitos computadorizados que não tiram mérito à animação tradicional, mas sim que lhe realçam e elevam a qualidade. Noutro aspecto, “Mr. Link” não dispõe de um argumento soberbo, até certo ponto poderá ser considerado genérico, mas, em sua defesa, alega-se que poucos são os filmes que não o são. Utiliza vários atalhos narrativos, como a omissão de uma boa parte da jornada, alguma falta de unicidade nas relações entre as personagens e a utilização pouco criativa dos antagonistas, falhas que se poderão desculpar num filme direccionado principalmente para crianças, mas não num filme que pretenda ser algo mais, num filme evoluído que queira ter qualidade independentemente da idade do espectador. Deste modo, “Mr. Link” pode ser examinado como um filme que joga os trunfos que tem e que tenta ocultar as suas cartas menos boas.
Até ao momento, as obras criadas pelo estúdio Laika estão divididas de um modo geral, olhando para a sua popularidade e aclamação crítica, em 2 grupos distintos: um grupo da frente onde se encontram “Kubo” e “Coraline” e um secundário onde estarão “ParaNorman” e “Os Monstros das Caixas”. “Mr. Link” irá ser categorizado (porque o ser humano precisa de atribuir categorias a tudo) certamente como pertencente ao segundo grupo. Contudo, não é motivo para ser considerado um filme menor, quanto muito poder-se-á dizer que é diferente dos anteriores. E, pensando um pouco, talvez será essa a moral que o filme quererá deixar.
Realização: Chris Butler
Argumento: Chris Butler
Elenco: Hugh Jackman, David Walliams, Stephen Fry
EUA/2019 – Animação
Sinopse: Mr. Link decide pedir a Sir Lionel Frost que o ajude na complicada missão de encontrar os seus parentes que há muito se perderam no lendário Vale de Shangri-La. Com a aventureira Adelina Fornight, este trio de exploradores viaja pelo mundo para ajudar Mr. Link na difícil procura dos seus familiares.