O Videoclube do Eduardo – O Cinema apenas traz sofrimento

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Filme em conversa: “The Kingdom of Dreams and Madness”

Género: Documentário

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Ano de estreia: 2013

Realizador: Mami Sunada

Elenco: Hayao Miyazaki, Toshio Suzuki, Hideaki Anno

Gosto de bons documentários sobre os bastidores das coisas. Sempre que vejo um bom filme ou leio um bom livro gosto de pensar no processo criativo e técnico que levou à sua criação, bem como ao esforço posto nesse trabalho, e “The Kingdom of Dreams and Madness” é um desses documentários. Através da câmara de Mami Sunada podemos entrar no quartel general dos estúdios Ghibli – casa mãe de “Túmulo dos Pirilampos”, “Totoro”, “A Viagem de Chihiro” e muitos, muitos outros filmes de animação – bem perto do coração de Tóquio onde o grande mestre Hayao Miyazaki acaba pacientemente o storyboard para aquele que será – até agora – o seu último filme: “As asas do Vento”, na companhia da sua braço-direito Yumiko e das cerca de 100 pessoas envolvidas na produção do filme.

“The Kingdom of Dreams and Madness” (2015)_1
O sorriso de um homem que ainda não decidiu o final de um filme que já começou a ser animado

O filme passa mais de uma hora a mostrar-nos o lado romântico da vida dentro da Ghibli e todas as reuniões, as pausas para observar o céu e as flores, o gato que se passeia pela estúdio, as memórias; praticamente tudo o que acaba exposto na arte e no espírito dos filmes Ghibli. Hayao explica o porquê de nunca escrever um argumento, preferindo em vez disso ir fazendo o storyboard em aguarelas; muitas vezes, diz ele, sem sequer saber o que irá fazer para a cena seguinte. Cada filme flui de forma orgânica, sem estrutura ditadora. Hayao e Suzuki explicam também a sua relação de amizade, explicam o porquê de fazerem cinema e explicam também a sua estranha relação com Isao Takahata, o outro membro fundador da produtora que, embora nunca presente fisicamente naquele edifício – Takahata está este tempo todo no edifício ao lado a realizar “O Conto da Princesa Kaguya” com a sua parte da equipa – acaba sempre em conversa por ser a antítese de Hayao na forma como trabalha – embora Isao não seja também amante de estruturas ou prazos -.

Mas depois acaba o romantismo e Hayao mostra o seu lado “real”. A sua vida quotidiana não se entende para além da sua secretária na Ghibli nem do seu atelier na sua própria casa; ele trabalha de Segunda a Sabado, das 11h ás 21h. Ao Domingo de manhã sai de casa para ajudar a limpar um rio. Todos os dias ele bebe o café, lê o jornal e trabalha, sempre com um grande sentido de orgulho no que faz mas sempre também com alguma melancolia: O Cinema traz apenas sofrimento” diz ele a uma surpreendida Mami – a realizadora –  que lhe pergunta o porquê de ele continuar a fazer filmes. Hayao não o sabe exactamente responder, mas as suas acções e olhares ao longo do documentário deixam essa resposta esclarecida. Hayao diz também – e essa opinião é partilhada por todos os líderes da Ghibli – que os dias do Estúdio estão contados, mas que o final inevitável não deve ser visto como algo negativo mas sim como algo natural, sem sentir qualquer tipo de rancor ou mágoa. Talvez seja então esse o motivo do documentário: A criação de um epitáfio para a Ghibli. – embora isto seja apenas a minha especulação –

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As palavras de Miyazaki na sequência final do documentário são um hino à criatividade

“The Kingdom of Dreams and Madness” é uma janela para o espírito criativo que nunca se tornou mais do que o desejo de fazer filmes, por muito trabalho e sacrifício que isso tenha causado. Um olhar sobre a vida de Hayao Miyazaki, que por sua vez se confunde com a vida da Ghibli, sobre relações entre pessoas, sobre ética e teimosia e sobre a passagem do Tempo e as mudanças que isso cria. Este filme é para todos os fãs da Ghibli. para todos os fãs de Animação. Para todos os fãs de Cinema e para todos os fãs de Pessoas.

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