Filme em conversa: Mistress America
Género: Comédia
Ano de estreia: 2015
Realizador: Noah Baumbach
Elenco: Greta Gerwig, Lola Kirke, Michael Chernus, Mathew Shear
País: EUA
2015 trouxe-nos dois filmes de Noah Baumbach, que é neste momento um dos meus cineastas favoritos e que vem desde há mais de vinte anos a criar uma identidade bastante própria – embora com vários clones a aparecer aqui e ali – dentro do Cinema americano.
Os filmes de Noah são quase sempre uma espécie de radionovela, onde tudo se desenvolve através de diálogos e sons e silêncios. Tudo se desenrola através destas personagens com falhas extremas, com neuroses, cheias de si mesmo ou exageradamente auto-criticas, iludidas e desiludidas, ignorantes e cultas, tudo ao extremo do desconfortável. E isso agrada-me. São uma espécie de Woody Allen para a gente nova que não se preocupa com os filmes do Woody Allen.
Em “Mistress America” são-nos então apresentadas duas personagens: A principal é Tracy (Lola Kirke) uma aluna universitária, inteligente e ambiciosa mas completamente sozinha e perdida na grande cidade; e Brooke, a sua futura meia-irmã, uma jovem-adulta já nos seus trinta anos, a viver ilegalmente num apartamento enorme de Manhattan e que fala sem parar sem nunca ouvir uma única palavra do que lhe é dito e que não consegue nunca seguir em frente com os seus planos. Essa mesma relação simbiótica entre as raparigas, bem como o choque que aparece quando ambas as personagens ganham uma nova e quase súbita maturidade é a força que move a narrativa deste filme. Enquanto que Brooke usa o seu carisma e o seu talento para falar e falar sem nunca ouvir, Tracy usa-a para se soltar mais enquanto pessoa e ir buscar inspiração enquanto escritora. Isto tudo acontecendo é claro enquanto nós ganhamos um filme que tem tanto de comédia maluca à moda antiga como de sátira agressiva. Tudo isto regado por uma banda sonora a lembrar os sintetizadores dos anos 80 – porque segundo as personagens do filme, retro é cool, aparentemente. –
Todo este filme tem o charme típico do realizador, bem como a sua característica forma de filmar, que parece quase documentarista – na minha opinião – mas “Mistress America” tem também um certo ar de John Hughes que é novo na sua filmografia. Uma certa sensação positiva que de que tudo vai acabar por ficar bem mais cedo ou mais tarde, o que é uma boa forma de manter “Mistress America” fresco e interessante.
Como em qualquer filme de Baumbach, quem brilha mais é o elenco. Os infindáveis lamentos de Brooke sobre o quanto ela quer abrir o seu misto de mercearia-restaurante-cabeleireiro são alguns dos momentos mais cómicos que vi nos últimos meses e tudo se deve à forma como Gerwig consegue interpretar as suas falas de forma desesperada mas ao mesmo tempo cheia de um sentimento de importância. Estamos perante uma actriz com um excelente lado cómico que merece certamente estar em maiores andanças em Hollywood, sendo que Lola Kirke não lhe fica muito atrás, com as suas reacções silenciosas aos devaneios de Brooke e com a forma como representa uma matreirice mascarada de ingenuidade típica do jovem intelectual sarcástico.
Fica então a recomendação de “Mistress America”.