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“Pecadores”: o inferno somos nós

“Pecadores” mistura terror, crítica racial, cultura negra e musicalidade num thriller vampírico ambientado em uma única noite nos anos 1940
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"Pecadores" (2025), de Ryan Coogler

Como numa cebola os vários plots de “Pecadores” vão-se abrindo à medida que o filme passa. A nossa respiração vai ficando suspensa mas a dúvida sobre o que mais pode vir dali adensa. Uma espécie de revival do “Aberto até de Madrugada” de Robert Rodriguez, onde se junta a luta dos negros e a sua cultura, principal destaque para a música, um pouco de Kuk Klux Kan, máfia, álcool e vida nocturna e claro já que é de noite, vampiros. Num momento, “Pecadores” celebra a cultura negra e no outro, faz-vos saltar do lugar. E pelo meio ainda é um pouco um musical. Mas a metáfora de um mundo mais equilibrado e sem discrimanação está lá – pela mão dos vampiros, ou pelos dentes se preferirem.

O filme começa em 1932 em flashforward, vemos Sammie (Miles Caton) entrar na igreja num carro, sozinho, coberto de sangue, carregando o braço de uma guitarra partida. É evidente que há uma história sobre como ele chegou ali, e estamos prestes a descobri-la. Os primos gémeos mais velhos de Sammie, Smoke e Stack (interpretados num duplo papel por Michael B. Jordan), regressam à cidade depois de uma digressão pela Alemanha na Segunda Guerra Mundial e de um período misterioso em Chicago para abrir uma juke joint (estabelecimento informal de música, dança, jogos e bebidas, operados sobretudo por afro-americanos).

O filme decorre ao longo de apenas 24 horas, mas leva o seu tempo a chegar à ação e aos elementos de terror da história. Os primeiros 40 minutos centram-se na organização da festa da noite, em que os irmãos vão à procura de uma equipa de animadores e de outros organizadores de festas e assim se vai compondo o elenco do filme mas também preenchendo espaços das histórias paralelas que acabam por caracterizar os personagens principais.

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A escalada do filme para o gore vampírico é boa porque nunca perde de vista as suas personagens, a sua realidade e a tensão do cenário que o realizador Ryan Coogler escolheu. Sim, os vampiros são brancos e as suas vítimas são maioritariamente negras, mas a oferta cruel dos vampiros para que os convidados se juntem às suas fileiras desalmadas transcende a simples parábola racial para um comentário mais complexo sobre as escolhas apresentadas às pessoas oprimidas: como é que as pessoas negras que vivem com o racismo endémico e a opressão conseguem ter sucesso num mundo de brancos sem perderem as suas identidades pelo caminho? Como é que se pode assimilar sem perder muito sangue? (piada implícita)

O filme de vampiros de Coogler, vívido e estimulante, coloca estas questões sem deixar de lado as surpresas ou o drama humano, e com um desempenho duplo genuinamente matizado e convincente de B. Jordan.

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“Pecadores”: o inferno somos nós
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