«Time can tear down a building or destroy a woman’s face Hours are like diamonds, don’t let them waste.»
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«A Costureirinha da Sé» de Manuel Guimarães
Manuel Guimarães (1915-1975) é um valor certo do cinema nacional. E quando se aproximam as comemorações dos 40 anos da Revolução de 25 de Abril, interessa trazer à luz a obra de um autor cujo talento e genialidade foram particularmente fustigados pela censura do Estado.
Formado em Pintura na Escola de Belas Artes do Porto, iniciou a carreira nas áreas da Cenografia, da Ilustração e da Caricatura. Iniciou o seu percurso cinematográfico através do desenho de cartazes de filmes até participar em produções de nomes como Manoel de Oliveira, Jorge Brum do Canto, Arthur Duarte e António Lopes Ribeiro como Assistente de Realização.
Venceu o Prémio Paz dos Reis atribuído pelo SNI – Secretariado Nacional da Informação com «O Desterrado – Vida e Obra de Soares dos Reis», o seu primeiro documentário, em 1949. Em 1951 adapta «Circo», romance de Leão Penedo, sob o titulo de «Saltimbancos», a sua primeira longa-metragem.
Em 1952 dirige «Nazaré», com argumento de Alves Redol. Neste filme são exibidos os hábitos e costumes daquela população. Devido ao seu forte cariz de critica social, o filme acabaria por ser censurado. Manuel Guimarães assume, então, uma parceria importante com o escritor neo- realista e em 1956 produz «Vidas Sem Rumo». Este filme viria a ser novamente censurado, resultando numa série de cortes e inevitável deturpação da obra.
Perseguido pelo Estado e devido ao fraco acolhimento do público é então que se dedica a filmes com uma forte componente comercial, e é neste contexto que em 1956 surge «A Costureirinha da Sé». Escolhe Maria de Fátima Bravo – à altura no auge da sua carreira – para o papel da protagonista, Aurora, empregada num atelier de costura e apaixonada por Armando, um taxista. Trata-se de uma adaptação da opereta popular de Armando Leite e Heitor Campos – meio musical, meio comédia – e que retrata a sociedade e os valores populares dos habitantes da cidade do Porto.
De notar o realce para a actividade – à época – da zona da Ribeira e a progressiva cosmopolização de uma cidade em crescimento e cada vez mais influente a nível nacional, em particular no Centro e na zona da Baixa, quer em termos de comércio, quer em termos de serviços prestados. No entanto, e independentemente deste progresso, o filme demonstra uma way of life muito típica das gentes nortenhas, muito próximas entre si e dos outros e alheias ao burburinho de uma ditadura macabra.
«A Costureirinha da Sé» apresenta-se como uma crónica de costumes, uma aguarela filmada num cinemascope avant-garde – foi o segundo filme a ser capturado neste formato em Portugal, depois de «O Homem do Dia» de Henrique Campos – que abarca tudo o que um local tem de especial, num determinado momento da sua história.
É um filme que nos deixa saudade e nostalgia: pelo que não se viveu, pelo que vivemos actualmente sem o desejarmos, e por um realizador que nos deixou demasiado cedo. Manuel Guimarães viria a falecer em 1975, um ano após a Revolução, sem nunca (e quem mais do que ele teria merecido!), criar em liberdade. Fica-nos a sua obra soberba, recentemente editada em formato DVD.


Próxima publicação (9 de Abril): «Northern Exposure: quando não importa que seja Cinema ou Televisão»