Estreou pela primeira vez em Portugal na secção oficial do Fantasporto 2011, tendo arrecadado o prémio de melhor realizador e, na categoria Orient Express, o de melhor filme. “Eu Vi o Diabo” (“I Saw the Devil”) era portanto um filme muito aguardado, do cineasta sul-coreano Kim Jee-woon, realizador do filme de terror “A Tale of Two Sisters” (2003) e do western “The Good, The Bad and the Weard” (2008). Vingança é o mote deste thriller psicológico de terror. O tema vingança tem sido bastante bem explorado pelo cinema sul-coreano por vários realizadores, premiados internacionalmente, como Chan-wook Park (“Sympathy for Mr. Vengeance”, “Oldboy”, “Sympathy for Lady Vengeance”, “Thirst”), Bong Joon-ho (“The Host”, “Mother”), Kkim Ji-woon (“A Tale of Two Sisters”, “A Bittersweet Life” e agora “I Saw the Devil”), entre outros.
Kyung-chul (Choi Min-sik) é um sádico sexual que mata sem remorsos e com requintes de crueldade. Com toda a polícia de Seul no seu encalço, nada o parece parar até ao dia em que escolhe como vítima a jovem noiva de Soo-hyun (Lee Byung-hun), um agente da polícia secreta coreana. Devastado pelo sofrimento e obcecado com a vingança, Soo-hyun só tem um objectivo: fazer Kyung-chul sentir o mesmo horror e sofrimento das suas vítimas. Assim começa um jogo macabro em que caçador e presa trocam de papéis: o psicopata assassino é convertido em vítima e a sua presa acaba transformado num monstro igual àquele que desejava destruir.
“Eu Vi o Diabo” poderia ser apenas mais um desses filmes de terror sobre a vingança, mas não, consegue abordar as mesmas questões que muitos outros fazem, mas de forma original e distinta. É um épico de vingança de duas horas e meia de duração que nos vai deixar aterrorizados pelo extremo sadismo que estas duas personagens transpiram. Logo na primeira cena do filme percebemos quem é o Diabo, mas durante as seguintes duas horas a nossa opinião irá mudar. A pergunta coloca-se – quem é o diabo?. O Diabo muda de rosto. Vingança contra vingança, quem é que tem razão? A certa altura não há razão que justifique as ações de ambos. É matar, ferir, fazer sofrer, porque sim. O prazer muitas vezes nem está presente, matam apenas porque são o Diabo. O próprio espectador quer que seja feita vingança, a um ou a outro, tanto faz, tornando-nos no próprio Diabo. Queremos que seja feita justiça? Essa palavra morreu a meio do filme, quando começamos a perceber qual o objectivo do polícia. Durante mais de duas horas de filme vemos, literalmente, uma caça. Dois animais que se caçam constantemente, que não pensam em parar, querem sempre fazer mais e mais.
Argumento, realização, fotografia (de Mogae Lee – como não podia deixar de ser, visto ser um filme asiático, a qualidade da imagem é fundamental) e a banda sonora são excelentes e resultam muito bem. Destaco a cena em que a polícia procura o corpo da mulher do polícia, a música e os movimentos de câmara, juntos, criam uma atmosfera muito bela e macabra ao mesmo tempo. Há ainda que referir as monstruosas interpretações do elenco principal, do polícia (Lee Byung-hun) e do sádico psicopata (Choi Min-sik, que depois da soberba interpretação em “Oldboy” cria aqui mais outra).
“Eu Vi o Diabo” não é um filme para todos. É preciso alguma coragem para assistir a este filme, não pelo terror, mas pela violência e pelas personagens que são a reencarnação do Diabo, se é que essa entidade sobrenatural realmente existe, na pele do Homem. Mais uma vez, o cinema sul-coreano tenta levar o ser humano sempre ao extremo, pois nunca é suficiente. Muito sangue, muita carne viva a ser cortada, muita violência, muito sadismo, é o que se pode esperar deste filme excecional. Que venham mais filmes destes da Coreia do Sul, que tem enriquecido tanto o cinema e o tem modernizado.
Realização: Jee-woon Kim
Argumento: Hoon-jung Park
Elenco: Lee Byung-hun, Choi Min-sik
Coreia do Sul/2010 – Terror
Sinopse: Numa noite de neve, a sua mais recente vítima é a atraente Ju-Yeon, filha de um chefe da polícia reformado e noiva de Soo-hyun, um agente especial de elite. Sedento de vingança, Soo-hyun decide perseguir o assassino mesmo que ao fazê-lo se torne também ele um monstro. E quando finalmente o consegue apanhar, entregá-lo às autoridades é a última coisa que lhe passa pela cabeça. A linha entre o bem e o mal desvanece-se neste diabólico e maquiavélico jogo do gato e do rato.