A ideia não é nova – um pai brinca com a filha, desenhando e recortando. E por ser Michel Gondry, faz e filma mesmo diversos filmes de animação, como se fossem histórias para adormecer. “Dá-me um título”, perguntou ele certamente várias vezes à filha Maya. E ficou “Maya, Donne-Moi un Titre”, o filme de animação stop-motion exibido na secção Generation KPlus.
Depois de sairmos dele temos a sensação de sair da sua própria cabeça, da imaginação fértil do autor do genial “O Despertar da Mente” (2004), mas também de “Natureza Humana” (2001), ou dos inevitáveis clips musicais de bandas como Daft Punk, White Stripes, Radiohead, etc, etc – a lista vai por ai fora…
O curioso é que o filme cresce com a vida de Maya, um pouco como uma variante de “Boyhood”, o tal filme de Richard Linkater (que apresenta em Berlim, já esta terça-feira, “Blue Moon”, em competição). Mas em que tudo, mas mesmo tudo, é apresentado na forma mais rudimentar de papel recortado, como um jogo artesanal de animação familiar. Uma outra particularidade é ter sido feito à distância, entre países diferentes, e múltiplas conversas ao telefone. Daí o titulo, ‘Maya, dá-me um título’.
Ao vê-los (sobretudo ela, que vimos em diferentes idades no filme), não resistimos perguntar: “a Maya é mesmo real ou uma invenção da sua imaginação”…
A resposta é boa: “Bom, nós não usamos peças de vestuário de papel”, diz o pai. Mas elabora: “Porque o meu trabalho é feito à mão e não com uma máquina, permite uma ligação maior. Na verdade, algo muito parecido com aquilo que eu fazia quando era criança”.
Por falar em criança, Maya (que não terá mais que dez anos) revela-se totalmente à vontade, exprimindo-se num inglês irrepreensível (ao contrário do macarrónico do pai que sempre manteve). Isto porque, explica o progenitor, “ela aprendeu três línguas ao mesmo tempo: Inglês, sueco e francês.” Aliás, numa das múltiplas histórias do filme, vemos uma versão da Maya mais adulta, em pleno controle da situação.

Michel revela-nos a fórmula: “tento colocá-la no seu universo, com o seu gato, o avô, a avó, a mãe. E, por vezes, eu também. Isto em espaços da casa que ela se pode identificar-se bem.”
O que se percebe é que é uma vida feita de criatividade. “Quando vemos um desenho, é apenas isso, um desenho. Se queremos dar-lhe movimento, temos de movê-lo com a mão. Mas quando animamos, temos de o fotografar. Aí ele move-se sozinho. É essa magia que fazemos.”
Maya fala até do papel da inteligência artificial… A resposta da criança revela maturidade q.b. “A I.A. pode ser muito interessante, mas também perigosa. Já sabemos que pode formular perguntas e produzir respostas. E até fazer uma pessoa artificialmente. Sim, já ouvi falar disso.”
Por fim, queremos saber se Maya tem algum desejo em prolongar a criatividade do pai. Imaginam a resposta? “Sim, acho que seria divertido. Mas sei que é muito difícil também”. Nisto, o pai explica que, por vezes, sente que “é ela a adulta na sala. O que fazer quando percebemos que temos uma filha mais esperta que nós?” Sim, vai ser bom esperar pelo futuro de Maya. E esse já tem um título: é já amanhã!

