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Tricia Tuttle na abertura da Berlinale: “O facto de estarmos aqui já e um ato de resistência”

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O júri internacional do Festival de Cinema Berlinale, a partir da esquerda, Nabil Ayouch, Rodrigo Moreno, Maria Schrader, Todd Haynes, Fan Bingbing, Bina Daigeler, Amy Nicholson e a diretora do festival, Tricia Tuttle, participam numa conferência de imprensa no dia de abertura do Festival Internacional de Cinema Berlinale, em Berlim, quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025. (AP Photo/Ebrahim Noroozi)

À neve e às temperaturas negativas no exterior, responde a Berlinale com conteúdo de forte pressão política. Pelo menos, assim será até a programação da 75.ª edição do Festival de Berlim que decorre até ao próximo dia 22, véspera das eleições locais. E com tudo o que lhe vem associado. Na verdade, a filiação política nunca esteve totalmente afastada do festival iniciado em 1951, poucos anos após uma guerra mundial, mas logo diante de uma nova guerra, desta vez Fria, com a ameaça atómica em pano de fundo.

Hoje, as coisas não são muito diferentes. Na Europa, com um conflito ainda aberto, além de uma paz pífia no Médio Oriente. E com a arrogância da maior potência do planeta a usar a folha de cálculo para se tornar ainda mais poderosa (e isolada). Como poderia o cinema não espelhar todas estas feridas sociais, humanitárias, económicas, políticas e belicistas?!

Essa vai ser uma tarefa desafiante para o júri internacional, liderado pelo cineasta americano Todd Haynes – e de que fazem também parte, o realizador marroquino Nabil Ayouch, a costume designer alemã Bina Daigeler, a atriz chinesa Fan Bingbing, o realizador Rodrigo Moreno, a crítica americana Amy Nicholson e a cineasta alemã Maria Schneider. A eles caberá a escolha do novo Urso de Ouro, sucedendo a “Dahomey”, de Mati Diop, abordando o tema da restituição colonial de obras de arte.

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Aliás, esse mote foi logo abordado na conferência de imprensa de apresentação do júri oficial presidido pelo realizador americano Todd Haynes (autor de obras centrais do cinema independente americano, na década e 90, como “Veneno” (1991), “Seguro” (1995) “Velvet Goldmine” (1998) ou “Longe do Paraíso” (2002). Como se esperava, a impunha-se ouvir a opinião do autor do intrigante “I’m Not There – Não Estou Aí”, explorando as várias facetas de Bob Dylan. Sobretudo na véspera da chegada a Berlim da equipa de “A Complete Unknown”, o filme (já estreado em Portugal) sobre o início de carreira e Bob Dylan, com Timothée Chalamet a dar boa conta do recado e a ver a sua composição de Dylan nomeada ao Óscar de Melhor Ator. Como ainda não tinha visto o filme, Haynes escusou-se de uma forma elegante, reforçando a tónica do seu filme: “Uma coisa que aprendi sobre o tema é que há muitos Dylans”.

De volta à política, abordou-se a reação ao posicionamento da administração Trump em relação ao cinema e à cultura: “Vivemos um estado de crise local e global. Muitos amigos e em todo o lado sentem essa barragem, com muita preocupação e choque.” Contudo, convocou a ideia do cinema como argumento de discussão de ideias, ao afirmar que “muitas pessoas estão a equacionar diferentes formas de resistência”. reforçando que “muitas pessoas que votaram neste presidente irão refletir as suas escolhas”, como forma de “manter a integridade naquilo que fazemos”.

Palavras que tiveram eco no colega de júri, o cineasta argentino Rodrigo Moreno (autor do ainda mais intrigante e irresistível “Los Delinquentes”), referindo que “na Argentina temos um governo com um louco fascista que se pronuncia todos os dias contra gays, educadores, tudo.”

Tricia Tuttle, a nova diretora do festival, sublinhou essa tarefa de “continuar a comunicar através do cinema, pois o facto de estarmos todos aqui já e um ato de resistência.” Mas, ao mesmo tempo, “rejeitar as ideias espalhadas por muitos partidos de extrema direita pelo mundo fora, pois o mundo tornou-se num lugar assustador.”