A agenda feminista Elas no Cinema em Lisboa, criada por nós, Letícia e Lígia, completa cinco anos em 2025. Para comemorar, expandiremos o nosso trabalho de divulgação de filmes realizados por mulheres e pessoas não-binárias exibidos em mostras, cineclubes, festivais de cinema e no circuito comercial de Lisboa com publicação semanal da rubrica “Elas no Cinema Pelo Mundo”, feita em colaboração com o Cinema Sétima Arte.
Alinhadas ao desafio #52FilmsByWomen, que consiste em assistir ao longo de um ano um filme por semana que seja dirigido por mulher, daremos dicas de filmes feitos por mulheres de vários países ao longo deste ano. Nem todas as nossas indicações estarão disponíveis em plataformas de streaming ou nas salas de cinema, mas queremos priorizar essas escolhas para que todo mundo tenha acesso a essas obras. Além de promover o trabalho de mulheres que admiramos, a ideia desta rubrica é trocar conhecimento, por isso compartilhem e comentem com sugestões de filmes ou de outras realizadoras que mais gente deveria conhecer.
Letícia Mendes e Lígia Maciel Ferraz
PALESTINA
“No Other Land”
[2024]
Realização: Basel Adra, Rachel Szor, Yuval Abraham e Hamdan Ballal
Disponível na Filmin
“No Other Land” é um filme urgente e atual. Basel Adra é um ativista e jornalista palestiniano de Masafer Yatta, na Cisjordânia, que documenta os despejos forçados das aldeias da sua região operados por soldados de Israel. Yuval Abraham é um jornalista israelita que apoia Basel na sua luta. O filme fala de conflitos atuais, mas, ao recorrer a imagens de arquivo em que os palestinianos já precisavam defender as suas terras das invasões de Israel, mostra também como o passado continua presente. “No Other Land” expõe os repertórios de violências aos quais as autoridades israelitas recorrem, seja na demolição das casas, na perseguição de ativistas ou na brutalidade com os palestinianos que vivem em condições cada vez mais indignas. Por outro lado, também valoriza a aliança antissionista entre Basel e Yuval, que não apenas inspira a solidariedade entre povos, como nos convoca à responsabilidade ética e moral de se posicionar contra o genocídio na Palestina. Filmado antes de 7 de outubro, “No Other Land” torna visível que os ataques de Israel são, antes, parte de um projeto de colonização baseada na eliminação de um povo.
CHILE
“A Memória Infinita”
[La Memoria Infinita, 2023]
Realização: Maite Alberdi
O jornalista Augusto Góngora foi um grande defensor do direito à memória das vítimas da ditadura chilena, cobrindo por muitos anos os crimes do regime de Pinochet, mas agora enfrenta outra batalha: a luta pela sua própria memória diante do Alzheimer. A sua companheira de vida, a atriz, ativista e política Paulina Urrutia, ajuda-o a preservar a memória, enquanto lida com as consequências do avanço da doença. É um filme afetuoso, e, ao mesmo tempo, difícil. Assim como mostra a cumplicidade e os laços afetivos do casal, não esconde as angústias que Augusto e Paulina passam, seja quando ele não a reconhece, ou quando abraça os seus livros, desejando que tudo que aprendeu com eles permaneça consigo. De modo semelhante ao que fez no filme anterior, “El Agente Topo” (2020), a realizadora Maite Alberdi também é respeitosa ao expor os desafios da velhice, não a limitando a isso.
ARGENTINA
“O Silêncio é um Corpo que Cai”
[El silencio es un cuerpo que cae, 2017]
Realização: Agustina Comedi
Disponível na Filmin
O acesso ao material de arquivo feito pelo próprio pai é o ponto de partida da realizadora Agustina Comedi para conhecê-lo melhor. A partir dos registos de Jaime, o filme move-se entre o privado e o público ao descobrir uma face da Argentina dos anos 1970 e 1990 pouco mostrada: a da efervescência homossexual, do ativismo e dos preconceitos associados à SIDA. Agustina Comedi transita entre as imagens deixadas pelo pai e os depoimentos transmitidos pelas pessoas próximas a Jaime para compreender os silêncios perpetrados por ele e ignorados pela sua família. Honesto e sensível, “O Silêncio é um Corpo que Cai” é uma forma de se aproximar de quem não está mais vivo e, por consequência, honrá-lo e mantê-lo vivo pela reprodução das suas memórias.