“Minha Mãe” é um filme autobiográfico, de homenagem; “é um filme muito pessoal” disse Nanni Moretti mesmo antes de o começarmos a ver. E poucos minutos depois percebemos porquê. A história de Minha Mãe é a história de Moretti que, enquanto rodava “Habemus Papam” em 2011, perdeu a mãe, tal como Margherita, a protagonista do filme, perde a mãe durante as filmagens do seu último filme.
A vida de Margherita é um caos – o fim de um relacionamento, a distância da filha adolescente, a realização de um filme que não podia estar a correr pior – e a deterioração do estado de saúde da mãe parece vir agonizar ainda mais uma situação com a qual deixa de conseguir lidar. Margherita vê a sua vida desmoronar-se e sentimos a sua impotência e o seu desajustamento em relação a tudo e a todos os que a rodeiam – veja-se a “dream-sequence” em que Margherita passa por uma enorme fila de pessoas na bilheteira para o filme “Asas do Desejo”, na qual encontra o seu irmão, a sua mãe, e a si própria, mais nova, e passa ao lado de todos eles, incluindo de si própria, tal como acontece durante todo o filme e percebemos ter acontecido durante toda a sua vida – Margherita vive ao lado de si própria, julgando e criticando tudo e todos e principalmente a si própria. Que Margherita (brilhantemente interpretada por Margherita Buy) é um alter-ego de Moretti, é mais do que óbvio desde o início do filme, mas a inversão de papéis não deixa de ser curiosa, uma vez que é no seu filme mais pessoal que Moretti se afasta mais, resguardando-se no papel de irmão e filho exemplar com a qual o próprio admite não se identificar, mas sobre o qual pouco ou nada sabemos. Quando questionado sobre a razão desta opção, Moretti justificou-a dizendo que lhe permitiu “mais lucidez”, que é algo que, conhecendo a obra e a personalidade do realizador, podemos interpretar como uma forma de protecção de alguém que não gosta de se expor demasiado.
Com uma carga emocional, naturalmente, pesada, dada a natureza do tema, Moretti tenta balanceá-la com o comic relief de John Turturro aqui a fazer de um actor americano com mais paleio do que nome que insiste, entre outras coisas, em afirmar que entrou num filme de Stanley Kubrick. A sua personagem tira, sem dúvida, algum do peso dramático do filme, mas não o suficiente. Moretti tenta balancear o filme entre o drama e a comédia, algo que faz aliás, como todos sabemos, extraordinariamente bem, mas que neste filme, talvez pelo seu carácter altamente pessoal, Moretti simplesmente não o consegue fazer, e daí resulta um filme desequilibrado, onde o trágico e o cómico parecem não encontrar um equilíbrio pleno e satisfatório.
“Minha mãe” não é Moretti no seu melhor absoluto. Não está ao nível de “Querido Diário” ou mesmo “O Quarto do Filho”, mas nem por isso deixa de ser um filme tocante, com excelentes interpretações (destaque naturalmente para as de Margherita Buy, Giulia Lazzarini e John Turturro), com um piscar de olhos a obras como “8 e ½”, “Asas do Desejo” ou “Noite Americana”, e a marca inconfundível de Moretti.
Realização: Nanni Moretti
Argumento: Nanni Moretti
Elenco: Margherita Buy, John Turturro, Giulia Lazzarini, Nanni Moretti
Itália/2015 – Drama
Sinopse: Margherita está a passar por uma grave crise existencial. Ela é uma realizadora de sucesso que está a fazer um filme sobre os trabalhadores de uma fábrica que foi vendida a uma multinacional. O gerente dessa fábrica é interpretado pelo famoso actor americano Barry Huggins. Ao mesmo tempo, com o irmão Giovanni, ela cuida da mãe em fase terminal, uma situação inevitável que Margherita não consegue aceitar.