Depois de três curtas-metragens (“Arena”, “Cerro Negro” e “Rafa”), João Salaviza já era uma das maiores promessas do cinema português. Mas se ainda restavam dúvidas, com “Montanha” tudo se confirma.
“Montanha” é a sua estreia no formato das longas-metragens, mas que mantém a sua forma de pensar, os temas, os sentimentos, as personagens, os pormenores. Salaviza tem um trabalho marcado pelos desgostos da infância e da adolescência, que continua a bulir neste seu novo trabalho.
Este é um retrato íntimo sobre a adolescência de David, um jovem de 14 anos que vagueia pelas ruas de Lisboa, enquanto aguarda por notícias do seu avô que se encontra hospitalizado em estado grave.
“Montanha” é nitidamente uma continuação do seu trabalho nas três curtas-metragens. Mantêm muitas semelhanças com o “Rafa”, no entanto Salaviza usava os negros como um dispositivo para cortar o tempo. Aqui não recorre a nada disso, usando uma linguagem um pouco diferente. Também usa o fora de campo para as figuras de autoridade, tal como fez em “Rafa”. Sendo que neste caso usa-o na cena da escola com a professora, que não aparece. As figuras de autoridade nos filmes deles nunca aparecem, ouvindo-se apenas a sua voz, renunciando sempre as figuras de autoridade.
Este é um filme de poucos diálogos, visto que até quando os há são colocados fora de campo. Um filme que vive muito da imagem, dos silêncios e das personagens. Os seus enquadramentos contam tudo, sendo que por vezes nem seria necessário recorrer à palavra, pois está lá tudo (a luz, o detalhe, o enquadramento, o sentimento).
Salaviza escala uma difícil e íngreme montanha e são poucos os que chegam ao topo dela. Este jovem cineasta deu provas mais do que suficientes de que filma como poucos. Essa montanha, esse símbolo, surge-nos logo no primeiro plano do filme, reflectido no corpo de David. E Salaviza filma com brilho o corpo. O filme vive muito disso também. O realizador tem sabido passar este sentimento de mágoa, através de um clima de afecto e emoção, como poucos.
Notável é também o desempenho de todo o elenco, David Mourato, Maria João Pinho, Ema Tavares, Rodrigo Perdigão, Cheyenne Domingues, Carloto Cotta e Ana Cris. O jovem ator David Mourato foi um achado de mestre.
“Montanha” é subtil, tocante e uma obra de um esplendor raro no cinema atual. Um dos melhores filmes do ano que transmite muita maturidade e inteligência por parte do jovem cineasta. Uma maravilha!
Realização: João Salaviza
Argumento: João Salaviza
Elenco: David Mourato, Maria João Pinho, Carloto Cotta, Rodrigo Perdigão
Portugal/2015 – Drama
Sinopse: Um Verão quente em Lisboa. David, 14 anos, aguarda a morte iminente do avô, mas recusa-se a visitá-lo, temendo esta perda terrível. A mãe, Mónica, passa as noites no hospital. O vazio pela falta do avô obriga David a tornar-se o homem da casa. David não se sente pronto para assumir este novo papel, mas o fim da infância aproxima-se sem que ele se aperceba…