Vamos esquecer o que já vimos antes. Não importam as comparações porque só serviriam para nos perdermos do objectivo. O trabalho de Denis Villeneuve é feito de raíz e tal como já nos vem a acostumar com filmes como “A Chegada”, “Blade Runner 2049” e “Sicario”, entre outros a perfeição técnica é levada bem a sério. Condensar um livro repleto de detalhes é sempre um caminho perigoso mas desafiante entre o que se corta, o que fica e o que se resume. Sem ser um despejar de informação e dados, a narração e os quadros pintados pelo realizador nas cenas acabam por de forma sóbria preencher a história, nas cenas importantes há tempo para a construção do arco das personagens, para ganharmos percepção das suas motivações. Assim as duas horas e trinta e cinco acabam por passar com facilidade e estranhamente para algo tão longo sabem apenas a um “amouse bouche” para o que se espera da saga.
O dom de Villeneuve para a narrativa visual está perto do genuinamente deslumbrante – as vastas paisagens desérticas que se desenrolam como oceanos e helicópteros com lâminas de asas de libélula onde os rotores deveriam estar, a ressonância constante da banda sonora de Hans Zimmer derrama-se sobre conjuntos de enormidade em escala planetária. Confirmando assim a afirmação do realizador que ver este filme num ecrã pequeno seria como usar um barco a motor potente numa banheira. Vejam-no no maior ecrã possível – digo-vos eu!
“Dune” centra-se na Casa dos Atreides, uma família que recebe a liderança de um planeta chamado Arrakis pelo governante soberano do universo conhecido, o Imperador Padishah Shaddam IV. Este planeta é um deserto inóspito, mas é a única fonte de uma substância inestimável e exclusiva conhecida como “especiaria”. Esta substância pode estender a juventude humana, vitalidade e longevidade. Shaddam realmente vê a Casa Atreides como um rival em potencial e uma ameaça e conspira com a Casa Harkonnen, que estava encarregada de colher especiarias em Arrakis anteriormente, para destruir a família. O romance e o filme são centrados em Paul Atreides (Timothée Chalamet), o herdeiro aparente da Casa Atreides, enquanto ele navega pela realocação de sua família para Akkrais, a traição do imperador Padishah e sua assimilação pela população nativa do planeta. A história e a complexa estrutura social que são essenciais para a visão do autor são condensadas numa nuvem, limitando a mitologia. As camadas de alegoria política, religiosa, ecológica e tecnológica que dão ao romance um status tão exaltado são transformadas no argumento de Jon Spaihts, Villeneuve e Eric Roth numa guerra comercial não envolvente, com o Barão Vladimir Harkonnen (Stellan Skarsgård) a ordenar um genocídio para garantir o monopólio da viciante “especiaria” encontrada apenas nas terras desertas do planeta Arrakis.
Villeneuve gasta uns bons quarenta e cinco minutos do filme essencialmente a estabelecer as bases, permitindo assim o acesso à saga a quem entra nela pela primeira vez sem ficar completamente desnorteado. Curiosamente esse fio-guia montado para o espectador serve também para orientar a personagem de Paul Atreides para o futuro. O papel de Zendaya/Chani, em particular, é basicamente um prelúdio para um arco maior que Paul parcialmente previu, onde ele vive entre os Fremen como seu “Lisan al Gaib”, ou profeta de fora do mundo, enquanto planeiam tomar de volta Arrakis. Um rápido vislumbre dele cavalgando um verme da areia sinaliza a extensão futura dos seus poderes. Outros atores, como Javier Bardem como o orgulhoso chefe Fremen Stilgar, presumivelmente terão mais o que fazer no próximo filme. Do lado do vilão, o barão Harkonnen levitante de Skarsgård e seu sobrinho bandido Rabban (Dave Bautista) estarão com certeza de volta para causar mais destruição.
Resta-nos agora esperar pela continuação que se encontra neste momento em fase de pré-produção.
