Inside Cinema #8 (Restless)

Querido Enoch,

Quando leres estas palavras, não te deites sobre a minha ausência e dorme sossegado.
Mesmo que tu estejas aí e eu esteja aqui, estaremos sempre juntos, no mesmo sítio,
se fecharmos os olhos. É por isso que te escrevo, e hei-de escrever-te sempre sem que
nunca te escreva: para que saibas que as nossas mãos não precisam de se dar para se sentir.

Já não estou aí, Enoch, e nada, nunca mais, fará com que vejas o meu rosto quando
acordares. Aceita. Aceita que o mundo continue tão real e tão igual a ontem.
Aceita que o vento apague do chão a marca a giz dos nossos corpos abraçados.
Shakespeare não deixará de ser lido e, por mais anos que passem, a tua música preferida
vai tocar nos teus discos. As fores vão florescer no jardim da mesma maneira, os livros
velhos vão guardar para sempre o cheiro do tempo que passou e as folhas de Outono
nunca serão menos belas. Haverá sempre o soar de um pássaro em todas as manhãs:
canta porque sabe que cada nascer do sol é um sopro de vida e, então, espanta-se de existir.

Também cantei todas as manhãs desde que te conheci – e assim continuaria, por mais
tempo que aí tivesse. Não penses que lamento. Deste-me a eternidade dentro dos dias
que tínhamos contados e eu não trocaria o nosso pequeno infinito por nada deste mundo.
Agora sei o que quer dizer “para sempre” e já não tenho medo, porque me ensinaste.
Há uma parte de mim que deixou de pertencer-me e agora é tua. Eternamente tua. Fui eu
que escolhi dar-ta, Enoch. Tu aceitaste e não imaginas o tamanho da minha gratidão.

Onde quer que estejas, onde quer que vás, voa como o pássaro e não deixes de te espantar.
Mando-te um beijo e fico no teu sorriso – é o lugar mais quente que conheci e onde
sempre quis estar.

Quando acordares, há um papel, à tua cabeceira, que diz

Para sempre tua,
Annabel

Guarda-o junto ao peito e sê feliz.