Com estreia directa na Netflix, “Apollo 10 ½” é um quase, quase filme biográfico para os primeiros anos de criança/adolescente de Richard Linklater que corre o risco de se tornar um dos principais fabricantes de nostalgia de Hollywood, a explorar tanto o humor quanto a pungência. Repetidamente, ele encontra maneiras novas e inventivas de refletir e refratar a sua própria história pessoal para o público. Explora a nostalgia de forma tão eficaz e interessante e também não tem tido medo de experimentar, movendo-se com facilidade entre projetos bastante simples e esforços de ambição. “Apollo 10 ½” é bem-sucedido não só por causa do enredo sobre uma viagem secreta à lua de um menino antes da missão “Apollo 11” mas porque dá a Linklater a chance de explorar o Texas da sua juventude numa particular época e realidade com a iminente chegada da humanidade à lua e como isso prendeu o quotidiano dos seus amigos e familiares.
Linklater, nascido em 1960, estaria a poucas semanas do seu nono aniversário quando a “Apollo 11” levou Neil Armstrong, Michael Collins e Buzz Aldrin ao espaço. E é sobre isso que o filme realmente trata, a ideia de que o jovem protagonista vai para a lua é uma brincadeira, ou não! O filme permite que Linklater se estique e nos conte como eram as coisas em Houston para uma criança durante o verão de 1969. Como todos os bons cinéfilos, Linklater também injeta um pouco do seu amor pelo cinema. Stan, que viu “2001: Uma Odisseia no Espaço“, de Kubrick, aborrece os amigos na escola a falar sobre o final do filme com um entusiasmo nem sempre apreciado. Stan e a família frequentam os drive-in e discutem sobre qual filme querem ver. Há um ambiente suburbano de uma classe média emergente norte americana que paira. O Vietname e a guerra não passam despercebidos, assim como o movimento hippie ou as referências musicais que rasgam o panorama conservador. Mas os momentos que ele mais enfatiza são aqueles que uma criança teria achado mais perturbadores, como os ferimentos que se sofrem nas brincadeiras/ jogos duros com os amigos do bairro, os braços e pernas partidas ou o terror da punição pelo diretor da escola numa época em que o uso da palmatória ainda era considerado certo e apropriado.
O mais incrível neste filme é percebermos o que ainda sobrevive na e da cultura popular americana e o que caiu no esquecimento desde 1969. Jack Black narra como uma versão mais velha de Stan (Milo Coy como o personagem infantil). Fala-nos sobre os discos, programas de televisão e filmes que ele e os seus cinco irmãos/irmãs devoravam, com os jantares de família que comia enquanto assistia aos lançamentos e preparações do projecto espacial. A dinâmica de uma família numerosa que se auto organiza nas tarefas diárias domésticas. Os irmãos mais velhos que cuidam dos mais novos e a clássica disputa de lugares no sofá. O pai de Stanley trabalha para a NASA e embora os seus filhos não compartilhem necessariamente do seu entusiasmo pela missão lunar, a empolgação é palpável para Stanley e para a família.
O filme usa um estilo de animação rotoscópio, para dar ao filme uma sensação de realismo. Esta técnica ajuda a reproduzir e exagerar contornos nítidos e fixos da captura de vídeo enquanto troca as subtilezas do sombreamento por campos uniformes de cores brilhantes. Da entrevista dada ao “Indiewire” ficamos também também a saber que este novo recurso de animação envolve “um híbrido mais ambicioso de animação desenhada à mão e CGI junto com acção ao vivo”. O elenco de voz inclui Jack Black e Zachary Levi, Glen Powell, Josh Wiggins, Milo Coy, Lee Eddy, Bill Wise, Natalie L’Amoreaux, Jessica Brynn Cohen, Sam Chipman e Danielle Guilbot. “Apollo 10 1/2” é uma co-produção da Linklater’s Detour Film Productions e Submarine com produção executiva de John Sloss. Os produtores são Linklater, Tommy Pallotta, Mike Blizzard, Femke Wolting e Bruno Felix.
“Apollo 10 1/2” é um filme encantador, que aborda a magia da infância de várias direções, sem nunca perder de vista as verdades fundamentais mais importantes. É inteligente, emocionante e engraçado, um filme que tem capacidade para ressoar em públicos de todas as idades.