Amanhã começa o maior festival de cinema do mundo. Após o estrondoso sucesso da edição de 2023, que projetou vários dos seus filmes para carreiras internacionais impressionantes e garantiu múltiplas nomeações ao Óscar, a edição de 2024 do Festival de Cannes parece querer dobrar ainda mais esta aposta. No entanto, o glamour deste ano provavelmente terá de disputar as atenções com uma série de contratempos: uma greve dos funcionários no meio do festival que ameaça chacoalhar a estrutura do evento, e pelos boatos de que novas revelações de abusos sexuais na indústria cinematográfica francesa está para ser divulgado nos próximos dias. Assim sendo, Cannes enfrentará o desafio de negociar suas crises ao mesmo tempo que divide os holofotes dos seus filmes com o habitual glamour da passarela vermelha. Uma tarefa que o seu diretor artístico, Thierry Fremaux, certamente já estará familiarizado.
De qualquer forma, enquanto o festival se prepara para lidar com essas adversidades, elaboramos uma pequena lista dos filmes que mais queremos ver nas próximas duas semanas e os quais queremos compartilhar aqui na nossa cobertura.
The Shrouds (David Cronenberg)
Dois anos depois de apresentar o seu incompreendido “Crimes do Futuro” na competição em Cannes, o canadiano aparece com outra obra enigmática de ficção científica. “The Shrouds” segue a história de Karsh (Vincent Cassel) um empresário do mundo tech que após o falecimento da sua esposa cria o GraveTech, um dispositivo que permite às pessoas monitorar seus entes queridos depois falecidos. Quando várias sepulturas, incluindo a de sua esposa, são violadas, Karsh decide investigar os responsáveis. Uma narrativa que poderia facilmente ser um episódio de Black Mirror, evocando a sombria sensação de um universo distópico mas que, ao mesmo, se assemelha muito ao nosso próprio. Estamos prontos para as próximas perversões do mestre.
Baby (Marcelo caetano)
Depois do seu filme anterior “Corpo Elétrico” (2017), que passou pelos festivais de Rotterdam e San Sebastian e que apresentou o brasileiro Marcelo Caetano ao mundo, aguardamos com expectativa o seu novo “Baby”, que estreia na paralela Semana da Crítica. O filme acompanha um rapaz de 18 anos que, ao se mudar para São Paulo, se envolve com um homem mais velho que ganha a vida vendendo seu corpo nas ruas. Não sabemos muita coisa sobre o filme mas pelo que vimos no teaser divulgado esta semana, parece que estamos diante de mais uma pérola queer repleta de sensualidade e intrigas urbanas.
Grand Tour (Miguel Gomes)
Envolto de mistério e segredo, é com muita expectativa que aguardamos o novo filme de Miguel Gomes, que marca o retorno de Portugal à competição em Cannes após 18 anos. O que se sabe da história até agora é que narra o dilema de um funcionário do Império Britânico que abandona sua noiva no dia do casamento e depois mergulha numa crise existencial ao questionar o paradeiro dela. As imagens em preto e branco divulgadas são de tirar o fôlego, a acabaram por gerar antecipação na imprensa estrangeira por algo no estilo de seu aclamado “Tabu”. Filipa Reis, a produtora do filme (e realizadora do “Légua”, que esteve em Cannes no ano passado), não confirma nem nega, mas deixa uma pista instigante: “será um acontecimento”.
Motel Destino (Karim Aïnouz)
Outro favorito de Cannes que está de volta é o brasileiro Karim Aïnouz. Seu último filme “Firebrand”, estrelado por Jude Law e Alicia Vikander, e que marcou sua primeira incursão na língua inglesa, estreou em competição o ano passado mas acabou por se revelar um pequeno passo em falso na bela filmografia do realizador. Agora, no seu sétimo filme de ficção, Karim retorna ao Brasil com “Motel Destino”, o único representante latino na competição deste ano. Os detalhes do enredo ainda conhecemos muito pouco, mas sabe-se que segue a jornada de um jovem e uma mulher em meio a desafios impostos por um sistema opressor.
O filme do realizador só estreia na segunda semana do festival, mas já estamos ansiosos só por saber que Aïnouz voltou à terra de onde sabe contar histórias como ninguém.
Lula (Oliver Stone)
Uma das grandes surpresas de Cannes deste ano, que juntou-se às últimas adições ao programa divulgadas dias depois do anúncio inicial, é o novo documentário do realizador Oliver Stone, intitulado “Lula”. O filme narra a trajetória dos 19 meses em que o presidente brasileiro esteve na prisão até sua terceira vitória nas eleições de 2022. Pelas informações divulgadas até agora, parece que Stone teve acesso exclusivo aos assessores de Lula e promete revelar bastidores importantes da falhada “Operação Lava Jato”, comandada pelo ex-juiz, hoje caído em desgraça, Sérgio Moro. Um dos títulos mais aguardados do festival deste ano, e que desde já promete causar grande controvérsia no Brasil.
Megalopolis (Francis Ford Coppola)
O mundo aguarda ansiosamente o desfecho da epopeia de Francis Ford Coppola para dar vida ao seu “Megalopolis”, após quase três décadas trabalhando no filme. As primeiras reações foram polarizadas: alguns o aclamaram como uma obra-prima, enquanto outros lhe deram o apelido maldoso de “MegaFlópolis”. O épico de pouco mais de duas horas não só é o “hot ticket” do festival deste ano como os seus bilhetes esgotaram na plataforma online de Cannes em apenas três segundos! Se todo esse frenesi valerá mesmo a pena, só descobriremos na noite de sábado, e retornaremos aqui para contar tudo. Mas independente do desfecho, o fato de ter um novo filme de Coppola entre nós já é, por si só, uma das maiores notícias do ano. Celebremos.
The Apprentice (Ali Abbasi)
O sueco de origem persa Ali Abbasi é outra presença habitual em Cannes. O realizador chamou a atenção ao vencer o ‘Un Certain Regard’ em 2018 com um pequeno alienígena chamado “Na Fronteira”, que circulou pelos principais festivais do mundo e acabou se tornando na submissão da Suécia para os Óscares daquele ano. Em 2022, Abbasi sobe à competição principal com o sombrio “Holy Spider”, mas o filme parecia tropeçar sob o peso da história real na qual era baseada. Agora, ao seu quarto filme, o realizador dá um passo ainda maior e se aventura no seu primeiro filme em língua inglesa para contar a história da ascensão de Donald Trump quando ele ainda era um ambicioso executivo imobiliário. Sebastian Stan retorna aqui como Trump, logo após vencer o urso na Berlinale em fevereiro, e Jeremy Strong o acompanha, trazendo alegria aos fãs de “Succession”, neste que já promete ser um dos filmes mais incendiários do programa.