Curiosamente a tradução para português do filme “Minnie & Moskowitz”, de 1971, é “Tempo de Amar”, mas a preposição “para” seria mais feliz tendo em conta que o realizador se propõe a demonstrar que o tempo não é a objecção para a emoção maior que todos deveriam ser dignos de conhecer, o Amor.
Falo de John Cassavetes, realizador, argumentista e actor americano, conhecido por filmes como “Uma mulher sob Influência” ou “Amantes” e que tinham como protagonista a sua esposa na vida real, a intemporal Gena Rowlands. Foi pioneiro do cinema independente americano na década 60 e 70 e na arte de maratonas de câmara atrás dos actores enquanto dava toda a liberdade para a performance das suas personagens através de aproximados ou longínquos planos.
Em boa verdade este par fazia muito barulho e os seus egos não tinham espaço nas quatro paredes mesmo que invisíveis. Ele temperamental, intransigente e possessivo, mas a transbordar brilhantismo e carácter. Ela lindíssima, sensível, electrizante, inteligente e sem corrimão para a sua insegurança. Juntos a trabalhar eram únicos e honestos e é em filmes como este que encontramos a explicação para os lirismos que o Amor não acarreta. Como em qualquer relacionamento aguçado a dança dos dois nem sempre foi fácil, mas a mesma foi o motor para ela ser a sua protagonista junto de um outro actor por vezes heterónimo de John Cassavetes. Na vida e no cinema a química deles era inegável, como se as suas diferenças ainda os aproximassem mais numa tempestade que não queria que a poeira baixasse.
O mais surpreendente de aglutinar as diferenças é também o modo como as mesmas são expressas entre casal. Até que ponto (ou não?) é justo viver numa loucura normal? Até que ponto a diferença é o que nos move ou onde nos queremos mover? E é em Minnie & Moskowitz que a colisão começa, onde no meio de uma relação de fachada, a pragmática Minnie (interpretada por Gena Rowlands) conhece Seymour (interpretado por Seymour Cassel), o desajeitado homem que a salva de voltar a subir os mesmos degraus da escada escura, fria e vazia. Seymour só fala de carros, a sua mãe ridiculariza-o e ninguém acredita nele. Minnie acredita no amor, vai ao cinema com a amiga ver Bogart, mas os seus óculos de sol escondem a complexidade do seu vazio interior. No meio de dois seres tão diferentes em duas classes sociais distintas a imprevisibilidade tinha tudo para dar errado, mas este é o filme que personifica a relação do casal (Gena e John) na vida real. As emoções não ficam em ponto de rebuçado e é extenuante ver como esta história nos envolve, aliás, John Cassavetes afirmou várias vezes que ficava em lágrimas ao ver a Gena Rowlands a actuar. Não querendo com isto dizer que ela apenas desempenhava papeis de si própria, muito pelo contrário, a sua presença é notável tal como a de Seymour Cassel e a proximidade enquanto casal é inevitável. Pode ter sido essa dualidade que trouxe mais sensibilidade e realismo à obra de ambos e claramente neste filme os medos e os anseios ganham preponderância, mas num caminho de aceitação e respeito pelas suas diferenças enquanto casal. De alguma forma é um jogo que só esta parelha sabe jogar, mas onde não há vencedores.
Na vida real e no cinema de Cassavetes quanto mais alto é o grito e mais hostil é a presença de dois seres maior é a essência porque as situações desditosas acabam por se perder pelo caminho. Se o Amor estiver lá, então podemos ir sempre mais longe.