Prestes a abrir portas (9 de dezembro), o Batalha Centro de Cinema tem vindo a divulgar o seu vasto leque de atividades, novos espaços e parcerias. A oferta pensada para as escolas ocupa um dos leques centrais deste novo Batalha, que quisemos conhecer mais a fundo junto da organização. Joana Canas Marques, uma das programadoras responsáveis pelo serviço educativo, partilhou com o Cinema Sétima Arte a visão do Batalha para o futuro próximo.
(C7A) O serviço educativo é uma das apostas do Batalha Centro de Cinema. O que podemos esperar do Programa Escolas?
(JCM) O Programa Escolas abrange quatro eixos que nos parecem fundamentais. O primeiro é a Exibição de Cinema, com um programa de filmes pensado para todos os ciclos escolares, através do qual procuramos proporcionar às escolas a exibição regular de cinema, com qualidade e variedade cinematográfica, promovendo a reflexão sobre temas pertinentes para os alunos e a comunidade escolar. No Programa de Proximidade, iremos trabalhar de forma regular com uma escola da proximidade do Batalha, fazendo além de atividades e oficinas com os alunos, um acompanhamento mais detalhado das sessões de exibição de cinema no Centro de Cinema, com atividades de rememoração e aprofundamento dos princípios do cinema e da imagem em movimento. Outro eixo essencial é direcionado aos docentes. Propomos um Grupo de Professores que arrancará em Maio de 2023, um espaço pedagógico de reflexão sobre o cinema e a educação, no qual, ao longo de seis sessões, com a equipa do Batalha e um orientador convidado, os professores poderão conversar sobre as suas experiências, discutindo como trabalhar o cinema em contexto escolar. Finalmente, e para um público mais adulto, o Big Show, uma mostra anual de cinema universitário em modo final show. Uma grande festa da produção de cinema das várias escolas do ensino superior do Porto, como a FBAUP, a ESMAD, a ESAP, a Escola das Artes da UCP e a Universidade Lusófona. Para esta mostra convidámos a atriz Cléo Diára, a produtora e realizadora Catarina Sousa e o professor e realizador Pedro Serrazina para selecionarem os filmes exibidos.
Em que medida a programação do Batalha pode ter um caráter formativo para os docentes?
De duas formas distintas, primeiro através de atividades específicas como o Grupo de Professores, do qual já falámos, e depois com outras ações formativas para todos os públicos como os cursos de média duração que propomos. O primeiro curso é focado na crítica de cinema e prevemos outros cursos, relacionados com a história do cinema. É nossa intenção procurar que estas atividades formativas tenham acreditação, permitindo aos docentes integrá-las nas suas formações anuais.
De que forma é que as escolas podem usufruir das vossas propostas?
As escolas poderão inscrever-se no programa de Exibição de Cinema através do site do Batalha Centro de Cinema, podendo escolher entre quatro temas, cada um deles com um programa específico desde o Pré-escolar até ao Secundário. Todas as sessões serão mediadas pela nossa equipa, havendo também algumas sessões especiais com convidados.
Ecologia, Amizade, Identidade e Diáspora foram os temas escolhidos para o Programa de Exibição de Cinema. Quais as reflexões que esperam motivar nos participantes?
Os curadores convidados pelo Batalha têm formação e experiência de programação distintas: Carlos Natálio é professor de cinema na Universidade Católica, crítico de cinema e programador no IndieLisboa, trabalhou com vários programas dedicados ao cinema em contexto educativo e escolar como o CinEd e o Plano Nacional de Cinema; Melissa Rodrigues é programadora, artista e arte educadora, o seu trabalho artístico incide na pesquisa sobre o papel do corpo negro nas artes; Miguel Ramos, da cooperativa teatral ‘A Confederação’, tem-se dedicado à programação infantil e à relação do cinema e da imagem em movimento com o teatro. Foi o encontro destas três visões que acabou por delinear os temas de programação, são temas atuais que se integram nos planos das escolas, mas que são suficientemente amplos para poderem incluir reflexões mais densas consoante a faixa etária a que se dedicam. Propomos um programa que acompanhe o crescimento individual dos alunos, refletindo sobre o papel do eu e o confronto desta descoberta de identidade com o outro e o mundo.
Está prevista alguma parceria com o Plano Nacional de Cinema?
O Plano Nacional de Cinema (PNC) é um projeto valioso para a educação para o cinema a nível nacional que funciona com uma lógica e pedagogia própria. Muitas das escolas com as quais trabalhamos estão também integradas no PNC, o que consideramos muito positivo. No entanto, a nossa missão é outra: pretendemos explorar cinema contemporâneo e de diferentes cinematografias. Não iremos, nem é a nossa missão, produzir elementos de constituição de conhecimento pedagógico, queremos focar-nos no trabalho na sala de cinema, quer através da qualidade da experiência cinematográfica quer através da mediação e das conversas pós-filme. Acreditamos que o cinema é um lugar de descoberta íntima, essencial na fase da infância e da adolescência. Gostaríamos de transmitir esta alegria da experiência de cinema em sala.
Percebemos que há uma grande variedade de cinematografias na lista, apenas quatro são produções portuguesas. Qual o lugar do cinema português neste contexto?
Sim, essa variedade foi intencional e esteve, desde o início, na base das discussões dos curadores do programa. O programa de Exibição de Cinema é muito vasto e composto por várias curtas e longas-metragens, contendo cinema de animação, ficção, documentário, cinema experimental e outras formas de imagem em movimento. Embora não em número, o cinema português tem uma importância central no programa. Duas das nossas sessões principais de longas-metragens são de cinema português. Falamos, por exemplo, do filme dedicado à Ecologia, da realizadora Margarida Cardoso, um filme que nos posiciona no universo de produção de algo tão comum para qualquer pessoa como o chocolate e do seu processo e viagens desde que nasce na terra até que chega às nossas bocas. É um filme importantíssimo que estamos muito felizes de poder trabalhar. Outro exemplo, embora seja uma produção francesa, é o filme do realizador luso-francês José Vieira, inserido no tema da Diáspora, para alunos do secundário, que faz precisamente um paralelo entre a emigração portuguesa em França, um tema tão central da história de Portugal dos últimos cem anos, e a situação de uma comunidade Roma nos anos 2000, ocupando a mesma zona que os portugueses e sofrendo os mesmos preconceitos. São ambos filmes essenciais no contexto cinematográfico português e que permitirão também uma abordagem abrangente do que é o cinema português contemporâneo.
Para além da programação direcionada para as escolas, existem diversas outras atividades para famílias e cinéfilos, da formação à escrita. O que nos podem desvendar sobre estas oficinas?
As oficinas para famílias acontecerão a cada interrupção letiva, durante as férias de Natal, da Páscoa e do Verão. A primeira acontece já em dezembro e será a ‘Oficina de Realização: Pára, Escuta e Olha!’ com coordenação e curadoria da realizadora e professora Amarante Abramovici. Durante um período de duas semanas, as crianças dos 9 aos 12 anos irão aprender e realizar, nas imediações do Batalha, um filme que será depois exibido em sala. Além das oficinas, teremos ainda sessões dedicadas a filmes para ver em família que acontecerão quinzenalmente aos sábados às 15h15 e cuja programação se articula com os ciclos temáticos e retrospetivas do Batalha Centro de Cinema. Será uma boa oportunidade para as crianças e adolescentes descobrirem com amigos ou em família a programação do Batalha.
A acessibilidade é também um tema na ordem do dia e não são muitos os espaços culturais preparados para acolher cidadãos com dificuldades motoras, auditivas ou de visão. No caso do Batalha é possível que surdos e cegos vejam cinema com condições específicas como LSE e Audiodescrição. Qual o convite que fazem a esta comunidade?
Gostaríamos que todas as pessoas, independentemente de terem alguma necessidade específica, se sintam bem-vindas e confortáveis no Batalha. Estamos conscientes de que, devido às limitações originais do edifício, e ao facto de este ser património histórico protegido, não foi possível tornar fisicamente o edifício completamente acessível. Mas estas são limitações que a nossa equipa está motivada a compensar.
O programa de cinema chega também, por exemplo, a escolas bilingues de alunos surdos e associações?
Relativamente a escolas, sim, temos previstas sessões com LSE e com Língua Gestual Portuguesa para escolas com alunos surdos e ensurdecidos. Teremos também sessões com audiodescrição para que os alunos cegos e de baixa visão possam usufruir da experiência do cinema.