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Óscares 2025: “Ainda Estou Aqui” faz história ao ser eleito Melhor Filme Internacional

“Ainda Estou Aqui” superou o controverso “Emilia Pérez”, de Jacques Audiard, que liderava as nomeações deste ano com 13 candidaturas
Ainda Estou Aqui Ainda Estou Aqui
Foto: Daniel Cole/Reuters

No último domingo (2), enquanto o Carnaval tomava conta das ruas e o clima da Copa do Mundo se fazia presente, o cinema brasileiro marcou um feito histórico na 97.ª edição dos Óscares. O drama “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, conquistou a estatueta de Melhor Filme Internacional, tornando-se a primeira produção nacional a triunfar nesta categoria.

Liderada por Fernanda Torres e Selton Mello, a produção brasileira superou concorrentes de peso, incluindo o polémico “Emilia Pérez”, de Jacques Audiard, representante da França e líder de nomeações deste ano, com 13 indicações. A concorrência também incluiu o soturno “A Rapariga da Agulha”, de Magnus von Horn (Dinamarca), o provocador “A Semente do Fruto Sagrado”, de Mohammad Rasoulof (Alemanha), e o encantador “Flow”, animação de Gints Zilbalodis (Letónia).

Ao receber a estatueta das mãos da atriz espanhola Penélope Cruz, Salles dedicou o prémio à advogada e ativista Eunice Paiva, personagem central da obra, e às suas intérpretes, as atrizes Fernanda Torres e Fernanda Montenegro.

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“Primeiramente, obrigado em nome do cinema brasileiro. Estou muito honrado por receber este prémio ao lado de um grupo de cineastas tão extraordinários”, iniciou Salles.

Continuando seu discurso, o cineasta disse: “Dedico este prémio a uma mulher que, após sofrer uma perda em um regime autoritário, decidiu não se curvar e resistir. Então, este prémio é para ela. O nome dela é Eunice Paiva. E também vai para as duas mulheres extraordinárias que deram vida a ela, Fernanda Torres e Fernanda Montenegro.”

Ainda Estou Aqui

O filme, ambientado no Brasil na década de 1970, retrata um país em plena crise, cada vez mais controlado pela repressão da ditadura militar. Baseado nas memórias de Marcelo Rubens Paiva, a trama mergulha na dura realidade da família Paiva.

A viver numa casa à beira-mar, a família mantém as suas portas sempre abertas aos amigos. O carinho e o humor que partilham entre si tornam-se formas subtis de resistência à opressão que domina o país.

Contudo, essa harmonia familiar é quebrada por um acto violento e sem justificação, que alterará os seus destinos para sempre. Após o sequestro de Rubens pela Polícia Militar, que o faz desaparecer sob a sua custódia, Eunice vê-se obrigada a se reinventar e a procurar um novo caminho para ela e para os filhos.

Impacto no mercado audiovisual

Além dos prémios, “Ainda Estou Aqui” fez história no mercado audiovisual. Com mais de 5 milhões de espectadores e uma arrecadação de R$ 104,7 milhões, o filme consolidou-se como a terceira maior bilheteira nacional desde 2018, superado apenas por “Minha Mãe é uma Peça 3” (2018), de Susana Garcia, e “Nada a Perder” (2019), de Alexandre Avancini, conforme dados da Secretaria de Regulação da Ancine.

Esse êxito nas bilheteiras teve reflexos positivos em todo o mercado audiovisual. Apenas em 2025, “Ainda Estou Aqui” foi responsável por 32% do público de filmes nacionais, o que contribuiu para uma quota de mercado de 30,1% do cinema brasileiro nesse período. Sem a sua presença, a participação nacional cairia para 22,1%.

No Brasil, após a estreia em setembro de 2024, o filme rapidamente ganhou uma ampla projecção. A vitória de Fernanda Torres nos Globos de Ouro foi um ponto de inflexão, levando a um aumento de 57% no público na semana seguinte e um impressionante crescimento de 122% na semana posterior.

A nomeação aos Óscares, anunciada em 23 de janeiro de 2025, foi mais um impulso, resultando num aumento de 89% no público semanal. Em fevereiro, a Semana do Cinema provocou um salto extraordinário de 174% na bilheteira, marcando a segunda melhor semana de exibição desde o lançamento.

O sucesso de “Ainda Estou Aqui” reflecte um momento promissor para o cinema brasileiro e reforça a importância das políticas públicas de apoio ao audiovisual.

Para os interessados em dados e métricas, a Ancine, através do Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual (OCA), disponibiliza painéis interactivos com dados actualizados sobre o mercado de exibição no Brasil, permitindo o acompanhamento do impacto de produções como esta.

Breve cronologia do sucesso

No dia 7 de setembro de 2024, durante o Festival de Veneza, “Ainda Estou Aqui” conquistou o Prémio de Melhor Argumento.

Em 19 de setembro, o filme fez a sua estreia no Brasil, com um lançamento inicial em apenas uma sala, em Salvador, na Bahia. Poucos dias depois, no dia 23 de setembro, foi escolhido pela Academia Brasileira de Cinema para representar o Brasil na corrida por uma vaga na categoria de Melhor Filme Internacional nos Óscares 2025.

Em outubro, o filme recebeu o Prémio do Público no Festival Internacional de Cinema de Vancouver. Já no dia 14 de novembro, o filme teve o seu lançamento nacional em 765 salas de cinema, atraindo 578.153 espectadores na primeira semana. Na segunda semana de exibição, o circuito foi ampliado para 893 salas, e o público aumentou em 38%, atingindo 796.776 espectadores.

Em 17 de dezembro de 2024, foi incluído na Shortlist do Óscar, sendo um dos 15 filmes pré-seleccionados para a categoria de Melhor Filme Internacional. No início do ano seguinte, em 5 de janeiro de 2025, Fernanda Torres levou o Globo de Ouro de Melhor Atriz em Filme de Drama pela sua interpretação no longa.

Na semana seguinte, entre 2 e 8 de janeiro, o filme teve um aumento de 57% no público, registando 121.909 espectadores, impulsionado pela premiação nos Globos de Ouro. Esse aumento continuou nas semanas seguintes, com um crescimento impressionante de 122% na 10.ª semana de exibição, alcançando 271.110 espectadores.

No entanto, a 11ª semana viu uma queda de 34%, com 177.931 espectadores. Em 23 de janeiro de 2025, “Ainda Estou Aqui” recebeu três nomeações aos Óscares, incluindo Melhor Filme, Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz. No dia 26 de janeiro, o filme também ganhou o Satellite Award de Melhor Atriz em Filme de Drama para Fernanda Torres.

A nomeação aos Óscares provocou uma nova alta no público. Entre 23 e 29 de janeiro, o filme teve um aumento de 89%, alcançando 336.059 espectadores, tornando-se a terceira maior bilheteira nacional desde 2018. No mês seguinte, entre 30 de janeiro e 5 de fevereiro, o filme registou uma queda de 26%, mas ainda manteve um público expressivo de 247.757.

Durante a Semana do Cinema, entre 6 e 12 de fevereiro de 2025, o filme viu um salto de 174% no público, indo de 248.883 para 682.202 espectadores, o segundo maior número de público semanal desde a estreia. Esse crescimento também foi acompanhado por um aumento no número de sessões e salas de exibição.

No dia 8 de fevereiro, “Ainda Estou Aqui” venceu o Prémio Goya de Melhor Filme Ibero-Americano e o Prémio do Público no Festival de Cinema de Roterdão.

No dia 10 de fevereiro, o filme também brilhou nos Gold Derby Film Awards, onde venceu em quatro categorias: Melhor Filme, Filme Internacional, Argumento e Atriz.

Entre 20 e 26 de fevereiro, o filme ultrapassou a marca de 5 milhões de espectadores, entrando para a lista das 15 maiores bilheteiras nacionais de todos os tempos. Finalmente, no dia 2 de março de 2025, “Ainda Estou Aqui” conquistou o tão esperado Óscar de Melhor Filme Internacional, selando a sua trajectória histórica.

Outros filmes que concorreram ao prémio

Ao longo da história dos Óscares, o Brasil viu 15 longas-metragens, entre produções e coproduções, serem nomeados para a prestigiada premiação.

Destes, sete são inteiramente brasileiros, enquanto oito resultaram de parcerias com países como os Estados Unidos, França e Itália. “Ainda Estou Aqui” segue essa tradição, sendo uma coprodução com a França.

O cinema brasileiro já conheceu momentos de grande destaque na cerimónia. “Cidade de Deus” (2002) arrecadou quatro nomeações, incluindo Melhor Realizador para Fernando Meirelles e Melhor Argumento Adaptado para Bráulio Mantovani.

Já “Central do Brasil” (1999), à semelhança de “Ainda Estou Aqui”, foi uma coprodução com a França e conquistou duas nomeações, incluindo Melhor Atriz para Fernanda Montenegro, tornando-se um dos marcos mais icónicos da cinematografia nacional.

A presença do Brasil nos Óscares não se limita à categoria de Melhor Filme Internacional. O país já foi distinguido noutras categorias, como Melhor Documentário, com títulos como a coprodução belgo-franco-brasileira “Raoni” (1979), de Jean-Pierre Dutilleux e Luiz Carlos Saldanha; a coprodução anglo-brasileira “Lixo Extraordinário” (2011), de Lucy Walker, João Jardim e Karen Harley; a coprodução franco-italo-brasileira “O Sal da Terra” (2015), de Juliano Salgado e Wim Wenders; e a produção brasileira “Democracia em Vertigem” (2020), de Petra Costa, que gerou grande repercussão a nível global.

No domínio da animação, o país destacou-se com “O Menino e o Mundo” (2016), de Alê Abreu, enquanto “História de Futebol” (1998), de Paulo Machline, representou o país na categoria de Melhor Curta-Metragem em Live-action.

No que toca à corrida ao Óscar de Melhor Filme Internacional, além de “Ainda Estou Aqui” e “Central do Brasil”, apenas três filmes brasileiros lograram a nomeação final: os dramas “O Pagador de Promessas” (1962), de Anselmo Duarte, e “O Quatrilho” (1995), de Fábio Barreto, e o thriller político “O Que é Isso, Companheiro?” (1997), de Bruno Barreto.