«Time can tear down a building or destroy a woman’s face Hours are like diamonds, don’t let them waste.»
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«Quick Change» de Howard Franklin e Bill Murray (1990)
«Quick Change» é o único filme realizado, até à data, por Bill Murray (n. 1950), reconhecido actor de comédia por obras da década de oitenta, tais como «Os Caça Fantasmas» (1984-1989), «A Lojinha dos Horrores» (1986) e «SOS Fantasmas» (1988), e da década de noventa e anos dois mil como «O Feitiço do Tempo» (1993), «Os Tenenbaums» (2000), «O Amor é um Lugar Estranho» (2003), «Broken Flowers» (2005), entre outros, ainda que compartilhe os créditos com Howard Franklin.
No advento do novo milénio, o trabalho de Bill Murray enquanto actor parece ter vindo a sofrer determinadas mutações. É impossível negar que os seus primeiros filmes se tratavam quase exclusivamente de aventuras dirigidas às famílias e às crianças, numa tentativa de visar as bilheteiras e os lugares cimeiros do box-office com clássicos do entretenimento. Com o avanço do tempo, Murray parece ter refinado o seu género de humor – negro, física e discursivamente simplificado – tendo começado a ser associado a diferentes realizadores de uma nova vaga do cinema moderno, que se identificavam com o seu género de interpretação e de personalidade enquanto artista que servia por inteiro os seus filmes.
O responsável pela materialização desta mudança foi o realizador norte-americano Wes Andeson, com «Os Tenenbaums». Anderson parece ter encontrado em Murray o seu actor-fetiche, a personificação das personagens mais acicatadas, tendo este feito parte, desde então, de mais cinco produções, como «Um Peixe Fora de Água» (2004) e «Moonrise Kingdom» (2012). Com «O Amor é um Lugar Estranho», Bill Murray assumir-se-ia verdadeiramente como um actor completo, dando à sua personagem neste filme de Sofia Coppola tamanha profundidade e leveza, ao representar na ficção o que porventura estaria a passar naquele preciso momento da carreira: um homem de meia idade, consciente da sua verdadeira pessoa, sem medo de enfrentar as circunstâncias da vida com humor e profunda emoção.
Em «Quick Change», um grupo de amigos, liderado por Grimm (Bill Murray) assalta um banco localizado em pleno centro de Manhattan. A estratégia utilizada tem tanto de simples como de original. Grimm disfarça-se de palhaço e leva o assalto adiante, enquanto que os restantes dois amigos se misturam entre os reféns no interior da agência. Enquanto que a policia satisfaz as suas exigências (tão surreais como helicópteros e carros elevados em rodas gigantes), os assaltantes saem do edifício barricado pelo seu próprio pé, sob a identidade de reféns libertados. Entretanto, enquanto que a policia tenta a todo o custo introduzir-se no interior do banco, já os assaltantes se encontram longe, a caminho do aeroporto para apanhar um voo com destino a uma ilha tropical.
A partir daqui, o enredo tece-se à volta desta fuga. A comicidade está nas peripécias que este grupo de assaltantes (que tem tanto de original como de comum) encontra até chegar ao seu destino. A duração do filme é curta e o seu estilo de comédia muito terra-a-terra. Embora consciente do tema do filme o espectador acompanha, surpreendido, o decorrer da acção. A introdução e a caracterização do protagonista surpreende-nos e faz-nos questionar o que realmente se irá passar. É tão simples como caricato o tacto com que Grimm brinda as personagens com quem se cruza durante o assalto (note-se o diálogo com o porteiro/ segurança e os telefonemas com o chefe da polícia). A falta de apegamento ao crime que está a cometer, como se de um acto natural se tratasse, a bem de uma causa maior, ou um serviço à sociedade, faz com que nos coloquemos do lado do assaltante. Um simples cidadão põe em prática um plano que só um criminoso de carreira conseguiria concretizar com tamanha leveza. «Quick Change» faz uso da fantasia clássica e generalizada do assalto ao banco que existe na sociedade e faz com que a audiência crie uma empatia com Grimm, Phyllis (Geena Davis) e Loomis (Randy Quaid). E quem nunca pensou um dia em como assaltaria um banco, caso esse dia chegasse?
«Quick Change» não é mais do que o que podíamos esperar, tendo em conta o período da produção de Hollywood em que se enquadra. No entanto, a originalidade do enredo e a forma como este se desenvolve (ao fim de trinta minutos o assalto já passou para segundo plano) seduz-nos e faz-nos rir com gags cómicos delirantes, mas tão singelos (como as justas entre dois homens montados em bicicletas ao som de um fado português).
Próxima publicação (11 de junho): «Zardoz e o cinema de aventura nos anos 70»